Dileep Thazhmon, CEO da Jeeves, não veio anunciar o futuro, ele o trouxe com sotaque estrangeiro e CPF local. Há dois anos e meio, a empresa aportava no Brasil com um único produto, o cartão corporativo. Hoje, oferece pagamentos, crédito e está prestes a obter sua licença de depósitos, algo que nem ele mesmo imaginava enfrentar tão cedo, tamanha a complexidade regulatória. Mas o que aconteceu no meio do caminho foi maior do que um plano de negócios, foi o impacto Brasil. Sim, o Brasil, com todas as suas contradições, entrou no centro da estratégia global de uma das fintechs mais promissoras do mundo. Por quê? Porque aqui, ao contrário do que se pensa lá fora, o sistema bancário é sofisticado, a inovação financeira é urgente, e as dores dos clientes são oportunidades camufladas.
Na prática, o país virou laboratório de soluções que agora serão exportadas. Um exemplo? Um sistema de criação programática de 25 mil cartões por mês para combater fraudes em agências de viagem. Algo criado por necessidade local, mas que está sendo levado para México, Colômbia e outros mercados. O Brasil, de laboratório, virou referência. E assim, um mercado historicamente sufocado por oligopólios bancários começa a inspirar novas arquiteturas de crédito, de margem, de risco e, principalmente, de relacionamento. Jeeves não quer ter 100 mil clientes. Quer ter 10 mil muito bem atendidos. Um banco boutique, digital, global mas com DNA brasileiro em sua operação mais completa. Dileep falou com franqueza sobre tarifas, volatilidade, compliance, espionagem corporativa (sim, startups também têm seus escândalos), e sobre algo ainda mais difícil de explicar: a arte de navegar em zonas cinzentas sem ultrapassar as linhas vermelhas.
“Depósitos tornam o crédito mais inteligente”, disse ele. “E o Brasil é o primeiro país onde teremos o stack completo. Por quê? Porque aqui, ou você é local, ou está fora do jogo.”
Essa lógica parece simples, mas representa uma guinada. Durante décadas, fomos o país que recebia soluções importadas, tropicalizadas às pressas. Agora, criamos produtos para o mundo a partir das fricções reais do nosso dia a dia. E se o Brasil é hoje o segundo maior mercado da Jeeves, logo atrás do México, isso não se deve ao acaso, mas à complexidade transformada em estratégia. Essa história não é sobre uma empresa. É sobre um país que parou de aceitar apenas ser cliente do futuro e começou a escrevê-lo. Com Pix, com APIs, com burocracias que obrigam à genialidade. Com fintechs que entendem que, por aqui, o jogo é outro e quem joga bem no Brasil, joga em qualquer lugar.
Do banco de trás, o Brasil saltou para o volante.