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O Web Summit Rio 2025 chegou ao fim deixando algo no ar que não era apenas maresia. Era inquietação. Mas daquelas boas, que te fazem querer mudar algo quando volta pra casa. Como um lembrete de que o futuro, na verdade, está sempre com o pé na porta.
A inteligência artificial saiu dos laboratórios e invadiu o centro do palco. Virou pauta de fundadores, de artistas, de cientistas e até de quem jurava que tecnologia era só assunto para o pessoal de TI. Só que agora ela escreve, fala, vê, sente. E não apenas isso, começa a raciocinar. A Agentic AI não é só um avanço técnico, é um novo tipo de companhia. Não mais companhia de hardware, mas companhia de consciência.
Márcio Aguiar, da Nvidia, puxou essa discussão com precisão cirúrgica. Mostrou que tokens são os novos átomos da inteligência. E que para moldar esse novo mundo, precisamos mais do que acesso a dados, precisamos visão, propósito, contexto. Ele falou de robôs, de simulações reais, do Omniverse, mas o que ficou mesmo foi a provocação: quem ainda acha que pode terceirizar o futuro, vai ficar para trás.
No outro canto do evento, Aloe Blacc e Kaivan Nikjou lembraram que criatividade sem humanidade vira algoritmo. Que a cultura tem algo que o código ainda não decifrou. E que talvez o papel da arte agora seja justamente esse, evitar que a tecnologia atropele a beleza do erro, da dúvida e da pausa.
Teve startup que nasceu no caos e virou unicórnio. Teve painel que começou falando de pitch e terminou discutindo política cambial. Teve palco onde se falava de computação quântica às 10h da manhã e outro que resgatava histórias de empreendedores do interior do Piauí às 14h. Essa é a potência do Rio. Um lugar onde o improvável parece sempre prestes a acontecer.
Mas, como em toda festa boa, fica o desejo de mais. Mais Brasil, mais América Latina, mais vozes da periferia do mundo digital. Os palcos principais ainda carregam um sotaque excessivamente globalizado, com um olhar muito voltado ao eixo norte. Que bom que Clara, ReadAI e DataSniper mostraram que podemos jogar em qualquer liga. Que bom que vimos dados sobre a adoção de IA no Brasil que não deixam nada a dever aos países do G7.
E já que estamos falando de futuro, vale uma provocação à curadoria, não só de conteúdo, mas de acesso. É hora de repensar quem tem voz, quem pode circular, quem pode influenciar de verdade. Ainda há uma distância desconfortável entre os palcos e quem espalha as ideias. Mídias independentes, especialistas de nicho, criadores de conteúdo que não ostentam grandes logotipos mas moldam percepções diariamente, merecem acesso direto a quem decide, investe e transforma. Não se constrói um ecossistema vibrante com pulseiras que restringem, mas com pontes que conectam. E se servir de inspiração, que venham mais gringos escutar histórias como a da Transfero, que está construindo uma solução de classe mundial a partir do Brasil, e que em breve vai ocupar com orgulho as páginas das mídias que acreditam no poder da periferia global.
Para os próximos anos, fica um pedido simples: não tenham medo de radicalizar na diversidade. Não falo apenas de gênero ou cor, falo de ideias. De trazer para o centro da conversa quem pensa diferente, quem constrói longe do Vale do Silício, quem faz com pouco e entrega muito. O Rio comporta isso. A América Latina precisa disso.
Porque no fim das contas, o Web Summit não é só sobre tecnologia. É sobre futuro. E futuro, como a gente bem sabe, nunca foi um lugar neutro. É um lugar que a gente decide construir, ou será construído sem a gente.
Nota do Editor
Parabéns mais uma vez à GL Events, especialmente na figura do incansável Eduardo Rodrigues, pela entrega impecável e profissional de um evento dessa magnitude. E o que dizer do Capim Santo? Não foi apenas comida, foi acolhimento. Foi afeto servido em cada detalhe. Eles tem o dom de misturar técnicas francesa com ingredientes tipo do Brasil. Parabéns a toda equipe e, em especial, à talentosíssima Morena Leite. Vocês não alimentam só o corpo, mas também a alma. Vocês são foda.