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Músicas que Máquinas Não Sabem Cantar


Photo by Sam Barnes/Web Summit via Sportsfile

Quando Aloe Blacc subiu ao palco do Web Summit Rio 2025, trazendo no currículo os hits “I Need a Dollar” e “Wake Me Up”, era fácil imaginar que ele cantaria. Mas ele estava ali por outro motivo: provocar. Ao lado de Kayvan Nikjou, fundador da FadeProof, discutiu o impacto da inteligência artificial nas indústrias criativas, da autoria de conteúdo à integridade artística em tempos de algoritmos generativos. A conversa começou com uma provocação que ressoou no auditório: “A IA pode escrever Wake Me Up?” A resposta foi direta. Aloe tentou, usando Gemini, ChatGPT, Sora. Mas as letras não tinham nuances. Faltava algo que, segundo ele, só a experiência humana poderia oferecer. “Eu dei um prompt lindo sobre o homem mais rico do mundo. A IA escreveu, mas não sentiu. Eu vivi”, disse.

A questão não era apenas técnica. Era existencial. Aloe defendeu que IA consegue simular sons, criar batidas convincentes, montar arranjos. Mas ainda não sente as luzes do palco, nem ouve os aplausos. Não tem memória tátil, nem coração partido. Em paralelo, Nikjou lembrou que a música já se tornou, muitas vezes, mais negócio do que arte. “Artistas são marcas”, disse Aloe. “Hoje, ganhamos mais dinheiro fora da música do que com ela. A música virou publicidade.” Segundo ele, por US$10 ao mês temos acesso a tudo. O valor, então, está em outra parte: no storytelling, na experiência, no impacto. O painel levantou também um alerta sobre a deturpação do conceito de autoria. Aloe compartilhou a criação de uma jaqueta com IA, um prompt no Midjourney gerou a estampa, que foi impressa e vendida via Shopify. “Quem é o dono disso? Se Murakami estiver em domínio público, sou eu. Se não, é ele. E eu quero honrá-lo.” A fala tocou num ponto sensível: IA não deve apagar a origem, mas reverenciar a fonte. Aloe fez um apelo por crédito, por royalties, por ética.

Outro momento marcante foi quando falou sobre sua colaboração com Gemini: usou IA para escrever uma palestra inteira para o Web Summit e a apresentou com auxílio de um ponto eletrônico automatizado, sem teleprompter. “Eu conversava com a IA como um co-autor. E foi ela que me guiou no palco.” Aloé ainda comentou sobre ferramentas como Suno.AI, que permite criar músicas com poucos cliques. Ele reconheceu que essas tecnologias mimetizam bem o passado, mas ainda carecem de originalidade. “IA é um bom afinador, mas precisa de ajuste humano.” Kayvan, de origem persa, trouxe outro ângulo. E citou o novo álbum de Ed Sheeran, que incorporou poesia iraniana sem uso de IA, apenas com sensibilidade humana. “Isso é influência autêntica”, disse ele. Aloe completou: “A IA é nossa inteligência artificial, mas a verdadeira AI que me interessa é autêntica influência.”

O debate então girou sobre o futuro. Aloe acredita que dentro de 20 anos, crianças nativas da IA vão considerar esses produtos tão reais quanto as canções que nos embalaram até hoje. O que hoje parece fake, amanhã será normal. Nikjou, mais cético, encerrou com uma provocação: “Se a IA sumisse amanhã, estaríamos bem.”

E talvez este seja o maior valor das indústrias criativas num mundo pós-algoritmo, lembrar que nem tudo precisa de escala para ser real, nem toda perfeição precisa ser artificial. A beleza da arte está ainda na falha humana.

Marco Marcelino

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