No ecossistema financeiro, cada milissegundo importa. A velocidade com que instituições bancárias processam, analisam e reagem às informações pode ser o diferencial entre fidelizar um cliente ou perdê-lo. A resposta para essa demanda crescente por performance tem nome: edge computing e análise de dados em tempo real.
A combinação dessas duas tecnologias está promovendo uma mudança estrutural na forma como os dados são tratados no setor financeiro. Em vez de enviar grandes volumes de dados para data centers centrais, instituições estão processando informações na “borda”, próximo de onde são geradas, reduzindo latência, otimizando custos e aumentando a segurança. Essa descentralização abre espaço para decisões mais rápidas e inteligentes, com impactos diretos na experiência do cliente e na eficiência operacional.
De acordo com Luciano Saboia, diretor de Pesquisa e Consultoria da IDC Brasil, o mercado de edge computing na América Latina deve movimentar cerca de US$ 7,9 bilhões, com expectativa de crescimento anual de 17,8%. No Brasil, o setor financeiro lidera essa transformação com casos concretos como os do Banco do Brasil, apresentados por Pedro Brant, diretor de Soluções para Meios de Pagamento, que destacou o uso de edge para cálculo de cupons de desconto em marketplaces, análise de sentimento em atendimentos e monitoramento de ransomware em tempo real.
Gabrielle Diaz, da Unico, ressaltou o papel do edge na validação de identidade, especialmente em um país onde nem toda a população tem acesso a smartphones com capacidade computacional para suportar modelos de IA embarcados. Segundo ela, o desafio é garantir que 95% da população com biometria registrada consiga capturar e validar seus dados com eficiência na ponta.
O avanço, porém, não vem sem desafios. Um dos principais pontos de atenção é a governança de dados em um ambiente distribuído. Como lembrou Gabrielle, com múltiplos pontos de captura e processamento, garantir segurança, privacidade e conformidade regulatória exige novos frameworks, criptografia avançada e múltiplos mecanismos de autenticação.
Pedro Brant também alertou para os gargalos estruturais: “Vamos ter gargalos até de energia elétrica”, disse, citando ainda as zonas cinzentas na regulação de dados em dispositivos. Segundo ele, é fundamental pensar na arquitetura desde já, mas sem perder de vista os custos e o retorno sobre o investimento.
Tacio Urohino, líder de desenvolvimento de negócios para a indústria financeira da AWS, complementou: “Edge, nuvem e conectividade formam a nova arquitetura digital do setor financeiro”. Ele destacou que essas tecnologias permitem escalar serviços como validação biométrica, análise antifraude e personalização de ofertas, com flexibilidade e controle de custos. Ainda segundo Tacio, a nuvem viabiliza modelos de escalabilidade progressiva e resiliência, fundamentais para serviços como o Pix.
O painel também abordou o impacto humano dessa transformação. Luciano Saboia alertou para a baixa proficiência em matemática da população brasileira e a dificuldade de formar profissionais com pensamento quantitativo aplicado à infraestrutura. A combinação de baixa base educacional com a crescente complexidade tecnológica pode ser um entrave à adoção plena.
Outro ponto crítico levantado por Gabrielle é o aumento do risco de ataques com a expansão do perímetro de segurança. Ao processar dados diretamente nos dispositivos dos usuários, cria-se um “laboratório” para agentes maliciosos testarem vulnerabilidades, o que exige times especializados e ferramentas avançadas de monitoramento contínuo.
O que está em jogo não é apenas a adoção de uma nova tecnologia, mas uma mudança de mentalidade. Como destacou Pedro Brant, a implementação do edge deve ser orientada por objetivos de negócio, e não por modismos. Ele cita o conceito do MIT chamado “triple imperative”: migrar de minds para machines, de produtos para plataformas e do core para a crowd. Em outras palavras, é necessário repensar jornadas, decisões e entregas com base em dados, contexto e personalização.
Seja na reestruturação de legados, na escolha de parceiros tecnológicos ou no investimento em talentos com domínio quantitativo, o recado final de Gabrielle Diaz resume bem a urgência: “Se sua empresa não está falando disso ainda, é hora de começar. Essas tecnologias vieram para ficar. Quem não estiver preparado, vai perder relevância”.