PET SHOP BOSS

Sergio Zimerman é um visionário que apostou em diversificação de serviços, integração de canais de vendas e tecnologia para transformar sua Petz em um fenômeno do segmento de animais de estimação – que tem arrancado suspiros na Bolsa de Valores.

O ano era 2002. O empresário Sergio Zimerman nunca havia, até então, pensado em trabalhar em um ramo onde os principais clientes fossem gatos e cachorros. Seu business na época era focado em alimentos e perfumaria. Quando, por uma série de motivos, esse negócio teve problemas, seu espírito empreendedor acabou levando-o, quase sem querer, para o segmento pet. Se a aposta deu certo? Hoje, a sua Petz é líder absoluta do setor, um sucesso comercial tão impressionante que, em setembro do ano passado, a companhia entrou na B3, a Bolsa de Valores brasileira, com um IPO (oferta inicial pública) que movimentou valores na casa dos R$ 3 bilhões.

Apostando em uma estratégia de omnicanalidade, integrando seus canais de venda, a Petz tem sido uma das empresas que podem se orgulhar de ter
melhorado seus resultados, em plena pandemia. Só no canal digital, a companhia mais que triplicou as suas vendas do ano passado para cá. Inquieto, Zimerman tem investido ainda em feira para donos de pets (a
primeira do Brasil), em uma rede de hospitais veterinários (com a marca Seres) e em tecnologia de ponta. Até inteligência artificial, para reconhecimento facial de cachorros, a empresa já tem no seu leque de
inovações.

Uma das grandes apostas dos investidores do mercado de capitais, a Petz transformou até a sua visão institucional: agora quer ser reconhecida como
o melhor ecossistema do segmento pet até 2025. Alguém duvida?

Feliz companheiro de dois yorkshires e um gato, em seu apartamento, mais cinco cães no sítio, Sergio Zimerman conversou com a reportagem da Empresário Digital sobre a onda de humanização dos pets, a importância de focar no bem-estar dos bichinhos e, claro, os fatores que explicam uma das
histórias mais bem-sucedidas de empreendedorismo do Brasil. É o que você vai ler a seguir.

EMPRESÁRIO DIGITAL – Estamos entre os cinco países que mais registram cachorros de raça. Como você vê a questão da cinofilia no Brasil?

SERGIO ZIMERMAN – Vejo com cautela. A boa cinofilia é contaminada pelos maus criadores, aqueles só envolvidos com a questão comercial e que não querem saber do bem-estar dos animais. Aliás, quando uma empresa está realmente envolvida com a questão do bem-estar, ela entende que uma compra em um canil – geralmente de um cachorro de raça – não deveria ser um problema, porque muitas pessoas acham que a única opção certa é adotar. E eu digo que comprar ou adotar, quando se trata da pessoa certa, alguém que ame animais, não faz a menor diferença.

Para o animal, pouco importa. O que interessa é como ele vai ser tratado
pelo resto da vida. No Brasil a gente tem um mercado razoavelmente bem
desenvolvido, com bons criadores, mas precisamos separar o joio do trigo.

ED – Por que justamente o Brasil se tornou um case em quantidade de
faculdades de veterinária?

SERGIO ZIMERMAN – Foi feito um estudo recente sobre o sonho de profissão das crianças, e muitas meninas e meninos dizem hoje que querem ser veterinários. É uma forma de transformar aquela paixão por pet em profissão.

Mas, claro, essa profusão de faculdades pelo Brasil todo, não necessariamente se reflete em qualidade. Temos ótimas faculdades, excelentes veterinários formados por elas, mas também muita mão de obra malformada. Rodando pelo país, percebemos que, a despeito do número impressionante de profissionais formados, há bastante dificuldade em um processo seletivo para se construir uma equipe. Não adianta só ter o curso de veterinário, a escola precisa ser boa.

ED – Hoje, empresas mais liberais já permitem levar o animal de estimação para o trabalho. Como você vê essa humanização do pet?

SERGIO ZIMERMAN – Nós mesmos, quando montamos o novo escritório em 2014, já permitimos que todos os funcionários pudessem levar seus pets
todos os dias. Uma das medidas mais recentes que adotamos dentro da
companhia foi a “licença-PETernidade”. Sabemos que, quando você compra
ou adota um pet, os primeiros dois dias do animalzinho no novo lar são cruciais para a adaptação. Então nós damos esses primeiros dois dias para o
funcionário lidar com esse momento tão importante. Temos convidado outras empresas a ter a mesma iniciativa, e a Vivo, por exemplo, aceitou prontamente. Queremos disseminar esse conceito no mercado porque, sob a ótica do bem-estar do animal, faz muito sentido.

ED – Você era dono de um atacadão e o transformou no Pet Center
Marginal, que viria a se chamar Petz em 2014. Como surgiu a ideia de
redirecionar os seus negócios para essa área de animais de estimação?

SERGIO ZIMERMAN – Meu conhecimento sobre o segmento pet em 2002 era muito limitado. Eu sabia que pet shop geralmente era uma loja pequena com, no máximo, 150 metros. E eu tinha, no antigo atacadão, uma área de 3.000m². Então não ligava uma coisa à outra, mas eu tinha um cunhado que fazia xampu para cachorro, literalmente, no quintal dele, e falava que esse mercado estava crescendo e que eu deveria considerar entrar nesse ramo. De início, achei a ideia muito sem sentido, mas como sou curioso, chamei o gerente da Pedigree [marca de rações] – um pouco envergonhado, confesso – para mostrar todo aquele meu espaço e perguntar o que ele achava da ideia de transformar aquilo em um imenso pet shop. E a resposta dele foi: “depende, você está pensando em fazer alguma coisa no estilo da Cobasi?”. Eu nunca tinha ouvido falar na marca. Assim que fui visitar as lojas gigantes que eles tinham, tomei a decisão de que era nesse negócio que eu iria entrar. Pensei que, se havia espaço para grandes lojas de pets nas zonas sul e oeste de São Paulo, onde a Cobasi tinha as suas unidades, por que não investir em outras nas zonas leste e norte? Afinal, o morador dessas regiões não precisaria atravessar a cidade inteira até chegar a uma Cobasi.

Como eu não conhecia nada do segmento, meu primeiro impulso foi me tornar franqueado deles. Eu queria mitigar riscos, só que o gerente da loja que conversou comigo me disse que os donos não atendiam interessados em franquias. Dito isso, parti para aprender sobre o setor e, assim, nasceu o Pet Center Marginal, que foi uma loja inspirada no que eu vi na Cobasi, mas não uma cópia.

ED – De cara, quais foram seus diferenciais?

SERGIO ZIMERMAN – Quando tive a negativa da franquia, fui dez dias consecutivos à loja central deles para entender o comportamento do consumidor. Eu não tinha nenhuma pretensão de ser melhor do que eles, porque já tinham uma variedade enorme de produtos, 17 anos de mercado… Então eu precisava prestar atenção no que eles não prestavam atenção. Vi, por exemplo, que eles não vendiam filhotes porque achavam que dava muita dor de cabeça. Então fui descobrir como se vendiam filhotes, e vi que era em porta-malas de carro e em feira de estrada. Pensei que essas opções tinham zero por cento a ver com bem-estar animal. Vender filhotes, para mim, fazia todo o sentido se a gente tivesse foco na qualidade de quem estava criando. Então já nascemos vendendo filhotes.

ED – O que mais você quis fazer de diferente?

SERGIO ZIMERMAN – Vi que na Cobasi os clientes não tinham atendimento no corredor e ficavam com muitas dúvidas. Só havia repositores, então criei o conceito de autosserviço com atendimento: as pessoas se serviam, mas havia atendentes para tirar dúvidas. Também percebi que eles não identificavam cliente nenhum no momento da compra, e eu achava que, para ter um relacionamento com o consumidor, é muito ruim você não saber quem está comprando. Então, desde o primeiro dia, dávamos um diferencial para quem era cadastrado e, assim tínhamos os dados do cliente. Já na parte de serviços, estética e veterinário, percebi que eles só alugavam espaços. Eu investi em equipes próprias e CLT, para que esses serviços tivessem o padrão da empresa e um nível de serviços de alta qualidade.

ED – A Petz investiu bastante em tecnologia nos últimos anos. Que tipo de necessidade vocês identificaram para tomar essa decisão?

SERGIO ZIMERMAN – Temos duas ações mais marcantes no que diz respeito à tecnologia, uma pelo caráter de competição e outra pelo de inovação. Quanto à competição, em 2015, tínhamos basicamente uma rede física de lojas e um e-commerce só para cumprir tabela. Vimos, então, que no Brasil as vendas digitais não tinham nenhuma relevância no segmento pet, mas em outros países estavam começando a ter. Aí passamos a fazer investimentos não só em tecnologia, mas em cultura e processos para fazer a dita omnicanalidade. A ideia era utilizar essa base de lojas como pontos de distribuição das vendas das plataformas digitais. Foi um trabalho bem longo, começou em 2015 e as primeiras lojas só começaram a ter esse serviço em 2018.

Hoje nós temos um modelo que tem 30% de vendas digitais com 85% de omnicanalidade. Eu diria que estamos entre os grandes cases do varejo mundial no que diz respeito à omnicanalidade – e isso tem atraído o interesse de investidores americanos, europeus, asiáticos e, evidentemente, brasileiros, para a nossa companhia. Essa opção foi fundamental como diferencial competitivo, inclusive para nos blindar contra Amazon, Magazine Luiza e todas as grandes plataformas digitais, já que conseguimos montar um sistema no qual o custo é menor e o nível é muito alto. Hoje, dos produtos que saem da loja para a casa do cliente, 94% acontecem em até um dia útil.

ED – E no que diz respeito à inovação?

SERGIO ZIMERMAN – Nosso outro investimento de tecnologia foi em termos de inteligência artificial para reconhecimento facial dos cachorros. O objetivo é identificar quando eles gostam ou não de um produto ou brinquedo. Não fizemos isso por volume de vendas, mas pela marca da inovação. Tanto é que ganhamos o Leão de Ouro do Festival de Cannes por conta de ser a primeira empresa do mundo a usar inteligência artificial em cães.

ED – A Petz deu um passo muito importante no ano passado, que foi abrir seu capital, e está tendo resultados incríveis. Por que tem sido tão bem-sucedida?

SERGIO ZIMERMAN – Esse processo de abertura de capital na verdade começou em 2013. Ficamos sete anos nos preparando, criando governança, profissionalização, conselho, comitês… todas as boas práticas que companhias de capital aberto devem ter. Então o IPO propriamente dito, veio sem traumas, pela maturidade que a empresa já tinha. Estávamos há anos nessa dinâmica de prestação de contas e de relação com o investidor. A única diferença é que antes, tínhamos um investidor, e agora temos mais de 70 mil investidores. Neste pós-IPO, a performance da empresa na bolsa está diretamente relacionada a essas ações anteriores. Temos mostrado, trimestre após trimestre, a nossa evolução de vendas digitais e de omnicanalidade.

Claramente temos feito um bom trabalho e mostrado que ele vem acompanhado de rentabilidade, porque é difícil empresas que conquistam share nesse mercado digital, ganharem dinheiro ao mesmo tempo. ED – Como você vê sua recente experiência de atuação em feiras específicas para o seu público? SERGIO ZIMERMAN – Eu entrei no segmento em 2002 e já em 2004 eu sonhava em fazer uma feira. Tentei, mas não conseguia, era muito caro e naquela época não tive o apoio necessário.

Demorou, mas finalmente em 2019, conseguimos lançar uma feira para o consumidor – foi a primeira iniciativa na América Latina de uma feira voltada ao tutor, e não ao profissional do segmento.

E ela foi um sucesso absoluto para os patrocinadores, expositores e nossa expectativa de público foi superada. Sob todos os aspectos, foi muito bom. Então contratamos para 2020 uma feira com o dobro do tamanho, só que aí veio a pandemia. Cogitou-se lançar em 2021, mas, prudentemente, eu vetei, porque achei que poderia acontecer o que de fato aconteceu, que foi a segunda onda do coronavírus. Mas acho que em 2022 conseguiremos lançar a segunda edição em parceria com a NürnbergMesse Brasil, uma das maiores organizadoras de feiras do mundo.

ED – A pandemia influenciou o seu negócio para além dessa questão da feira?

SERGIO ZIMERMAN – Muitas coisas mudaram, incluindo aí a forma de gerir a empresa. Com as videoconferências, hoje faço sete ou oito reuniões diariamente, quando antes eram quatro, no máximo. Houve benefícios de produtividade, ganhamos deslocamento e começamos a conectar pessoas de diferentes regiões do Brasil. Para uma rede como a nossa, que tem atuação nacional, isso é muito rico. Podemos juntar todos os gerentes em uma plataforma e passar uma mensagem em tempo real.

Quanto aos nossos consumidores, eles também alteraram a maneira de comprar. Vendíamos 7% pelo digital e agora, no primeiro trimestre, foram 29%. E não vemos motivo para esse número decrescer quando a normalidade voltar. Imaginamos que continuaremos tendo vendas expressivas – seja para o cliente só retirar na loja ou receber no conforto da casa dele.

Outubro 2024

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