Cliente que reclama é aquele que quer continuar sendo cliente. Seria muito mais simples, virar as costas e mudar de ares. Tirar aquela empresa da sua vida para sempre. Mas e quando você é fã da marca e se vê numa experiência que te desagrade?
É bem verdade que algumas experiências não refletem a missão e os valores da empresa. Mas sabemos que quanto maior o negócio, maior o número de pessoas e tecnologias envolvidas. Consequentemente, maiores as chances de erros nos processos e eventuais falhas.
Nas empresas com boas práticas de atendimento, quando essas falhas se transformam em queixas, elas são ouvidas e tratadas com o respeito devido. E algumas jornadas podem ser repensadas.
Por outro lado, quando o C-level da empresa ignora uma queixa e não assume um erro, o recado que transmite aos demais funcionários é que o cliente pouco importa.
No meu entendimento, um consumidor fã da marca, ao dar feedback e reportar suas boas e más experiências, proporciona uma oportunidade de ouro à empresa: a de se olhar no espelho e melhorar o que (e como) oferece a seus clientes.
Recentemente, tive de antecipar um voo de Portugal para o Brasil. Recorri às milhas que tinha para comprar uma passagem de última hora. Mesmo sabendo que é mais caro, conectei meu computador e fiz a cotação. O custo equivaleria a 276.348 milhas. Mas, ao fechar a compra, uma surpresa: o site que abriu numa versão Europa em ES (espanhol) deu erro e sugeriu que eu mudasse para PT (português). Nessa mera mudança de idioma, minha viagem passou a custar o dobro: 592.996 milhas.
Eu então tentei por outros idiomas, como US (inglês), no qual o valor voltava ao nível de 276.334 milhas. Porém… Nova mudança de idioma e o dobro das milhas de novo. Claramente um erro, já que para adquirir uma milha a regra é a dolarização e pagamos pela diferença do câmbio. Mas minha urgência falou mais alto e comprei assim mesmo. Então pensei: depois eu mando uma mensagem explicando o que aconteceu. E até gravei o processo.
Por vias normais, não consegui sequer transmitir as imagens. Dava erro no sistema da companhia. Usei, então, o recurso das redes sociais para chegar a quem tem poder de decisão de corrigir os
processos da empresa: o CEO. Alertei sobre o erro, apresentando as imagens como prova. Ele prontamente disse que alguém faria contato comigo. O contato, entretanto, foi um e-mail padrão dizendo que o problema de custar mais caro era consequência de eu ter deixado para comprar de última hora.
Só que essa não era minha queixa. E esse canal não me dava espaço para explicar isso. Enfim, se a companhia já tinha errado no processo de aquisição da passagem, errou mais ainda no atendimento a um cliente que apresenta essa falha. Nem o sistema automatizado, nem o profissional com o maior cargo na empresa, aproveitaram a oportunidade de escutar com acolhimento uma reclamação para fazer um ajuste necessário de tecnologia.
Ou seja, casos como esse, que se repetem em outras empresas e em outros setores, são mais que um erro. Representam uma mentalidade de que o importante é vender o produto ou serviço, e que a jornada com o cliente termina aí.
E então não adianta ficar frustrado com a resposta automática da tecnologia. Ela não pode corrigir uma conduta que está sendo estabelecida, equivocadamente, como correta.
Foi para abrir olhos e ouvidos dessas empresas que surgiram fenômenos de transformação cultural como o Reclame Aqui e o Instituto Cliente Feliz – ambos empreendimentos que se tornaram sucesso pelas mãos da nossa personagem de capa, Gisele Paula. São iniciativas incríveis e revolucionárias, que ampliaram a voz do consumidor a um volume impossível de ignorar.
Felizmente, não foram poucas as empresas que têm prestado a devida atenção a essa voz, aprimorando seus processos, treinando melhor suas equipes, ajustando suas tecnologias… E, além disso, dando uma resposta satisfatória ao cliente que, justamente por se importar com a marca, deu-se ao trabalho de interromper suas atividades cotidianas para mandar uma mensagem à empresa, comunicando uma experiência frustrante.
Que mais negócios olhem com atenção para os empreendimentos de Gisele Paula e compreendam que uma reclamação não é um incômodo do qual eles devem se livrar o mais rápido possível ou ignorar: pelo contrário, é uma declaração de amor do cliente. E você nunca deve responder a declarações de amor com indiferença.