Criador de destinos

Aldo Leone Filho, presidente da Agaxtur, é herdeiro de uma tradição de excelência no atendimento ao cliente para oferecer o melhor roteiro para as suas viagens de turismo, algo que recebeu do pai. Hoje, sua empresa comemora 70 anos e também uma fusão que vai superdimensionar o negócio.

Sete décadas proporcionando memórias felizes na mente das pessoas. Essa é a história da Agaxtur, uma agência de viagem que começou familiar, fundada pelo pai do atual presidente, e evoluiu revolucionando o turismo no Brasil. Inventou conceitos para esse setor que existem até hoje e agora vive um momento muito especial na sua trajetória.

No segundo semestre do ano passado, o Grupo Águia Branca, gigante da área de transportes, que faturou R$ 10 bilhões em 2021, adquiriu 70% do controle acionário da agência de viagem. Com a fusão, a Agaxtur, que começou como um pequeno negócio para ajudar passageiros no Porto de Santos, agora é capaz de mirar novos voos, mais arrojados, além de ampliar sua oferta de produtos.

É sobre essa reviravolta que conta aqui o atual presidente da empresa, Aldo Leone Filho, que não perdia uma viagem com o pai quando era criança. De quebra, o executivo nos dá uma aula sobre a história do turismo no Brasil.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como foi o começo da história da Agaxtur?

ALDO LEONE FILHO A Agaxtur começou com meu pai em 1951. Ele trabalhava como guia turístico no Porto de Santos quando abriu essa empresa. Chamava-se na época Agência Auxiliar de Turismo. Isso porque ele ajudava as pessoas a descer do navio no porto e vir para São Paulo.Até que, em 1953, ele precisava de um endereço telegráfico, e aí a marca mudou para Agaxtur. Como é até hoje.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como o trabalho fundador do seu pai te inspira ainda?

ALDO LEONE FILHO O que ele fez há 70 anos é o mesmo que a gente faz hoje. A Agaxtur continua sendo uma empresa prestadora de serviços de uma maneira consciente e consistente. Nossos guias e colaboradores no mundo todo têm o conceito de atendimento ao cliente em primeiro lugar acima de tudo. Igualzinho como meu pai começou lá atrás.

EMPRESÁRIO DIGITAL Em que ponto dessa trajetória você acha que virou a chave para chegar ao nível em que vocês estão hoje, com 28 mil clientes?

ALDO LEONE FILHO A história da Agaxtur é dividida por fases de décadas. Na de 1950, quando foi fundada, quem viajava era uma alta elite. Meu pai e minha mãe foram passar a lua de mel deles em Miami, era um luxo viajar de avião. Foi uma fase romântica. Nos anos 1960, a primeira coisa que a Agaxtur fez foi criar os pacotes para a Argentina, Bahia, que foi o primeiro destino brasileiro procurado pelos turistas, e os cruzeiros marítimos. Na época, o Brasil possuía quatro navios de bandeira brasileira que faziam a costa do país. A ideia da Agaxtur foi pegar um navio daqueles e transformar num cruzeiro marítimo. Existe uma grande diferença entre navios que transportam passageiros e o termo cruise, de cruzeiro marítimo. Foi meu pai quem teve a ideia de inventar o termo “cruzeiro marítimo”, exatamente no dia 1º de julho de 1963.

Ele fez o primeiro cruzeiro para a Amazônia, levando 400 passageiros de Santos, passando pelos portos do Rio de Janeiro, de Salvador, do Recife, de Belém do Pará até chegar a Manaus. E essa viagem foi um sucesso. Ele colocava os garçons dos melhores restaurantes de São Paulo a bordo, tinha shows de música, as pessoas iam de roupa de gala e faziam uma festa. Era ainda uma elite que viajava naquele tempo. Nos anos 1970, você já começava uma época de massificação do turismo. Em 1972, abriu o parque da Disneyworld, na Flórida. E eu fui para lá em 1973, conheci a Disney com 9 anos de idade. Já começava aquele grupo grande de pessoas viajando para conhecer esse único parque da Disney. Hoje nós temos 15 parques em Orlando para você passar dez dias.

EMPRESÁRIO DIGITAL E como foi esse começo de massificação no Brasil?

ALDO LEONE FILHO Aqui havia o turismo rodoviário. A Agaxtur tinha uma frota de ônibus que saía da Avenida Paulista toda sexta-feira para excursões, para Gramado e Canela, que chamávamos de Rota das Hortênsias. E também para as cidades históricas de Minas Gerais. Naquele tempo não se fazia isso com avião. A primeira companhia a explorar esse nicho foi a Transbrasil, com seus DC-9 coloridos. Então você já tinha naquele tempo o turismo internacional, Estados Unidos e Europa, já tinha a Disney, os cruzeiros da costa brasileira e o turismo rodoviário. Depois, nos anos 1980, foi criado o termo resort. Houve quatro que eu conheci: o Tropical, de Manaus, o Quatro Rodas, do Maranhão, o Tropical, da Bahia, e o Foz de Iguaçu, que hoje é o Belmonte, o mais luxuoso de lá.

Tinha também o Jatiúca, de Maceió, que foi a Agaxtur que abriu. Então foi quando surgiram esses resorts, onde você passava vários dias, com serviços diversos, e curtia suas férias.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como era a estrutura da Agaxtur nessa época?

ALDO LEONE FILHO Tínhamos quatro lojas, uma em São Paulo capital, uma em Santos, uma em Guarulhos e outra em Araraquara. Foi quando eu comecei a trabalhar na empresa, em 1987. Meu primeiro cargo foi de vigia de mala, para ver se ela não andava sozinha no aeroporto, e também tomar conta de passageiro. Ou seja, colocar o passageiro e as malas dentro do avião. E era o que eu fazia o tempo inteiro. Contava as malas quando saíam e quando chegavam. Gostei de trabalhar na empresa, tinha sinergia com meu pai desde pequeno, viajávamos muito juntos. Só que, a partir daí, o turismo já não era aquele do romantismo; era um turismo de massa. Nos anos 1990, quando o Collor abriu o Brasil para os mercados de fora, ficou tudo mais fácil. O único lugar em que precisávamos de visto sempre foi o dos Estados Unidos. Bariloche continua forte até hoje; Flórida, Disney é sucesso garantido. Nova York e Europa também. Aí, nos anos 2000, surgiu o diferente: a África. Em 2008, eu já levava grupos para Dubai, já existia o Oriente Médio. O que mudou? Nada.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como assim?

ALDO LEONE FILHO Fazemos turismo da mesma maneira, com a diferença de que massificou. Hoje você tem turismo para diversos bolsos. No dia zero da Agaxtur, talvez você só tivesse turismo para um bolso. Hoje é diferente. Tem programa para quem só quer pegar o carro e fazer uma viagem curta para a praia, e tem o turismo em que você possui um avião privado, que te permite dar uma volta ao mundo em 120 dias. Ou um cruzeiro marítimo em que você pode morar no navio o resto da vida, visitando o mundo inteiro. Eu transmito para a nossa organização essa tranquilidade de que a gente vai entregar cada um desses tipos de viagem para quem quiser uma programação aqui com a gente.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como vocês estão celebrando esses 70 anos de empresa?

ALDO LEONE FILHO Esses 70 anos marcam um ponto. Eu me lembro da festa de 35 anos da empresa. Depois, na de 40, a gente fechou o Teatro Municipal, encomendou uma audição exclusiva para a Agaxtur. Na de 50, fechamos o Golden Hall da WTC e contratamos uma orquestra só para tocar sucessos de big bands dos anos 1950. Nos 60 anos, tivemos uma exposição no MIS exclusiva sobre as décadas de turismo. E agora, nos 70, colocamos dez torres de led contando um pouco da nossa história. Aí fizemos uma promoção de 70 horas, agora a dos 70 destinos. Mas, mais do que isso, é o marco de chegar aos 70 anos. Confesso a você que teve uma hora em que eu ratiei, e achei que não fossêmos chegar. Você ter uma organização complexa, pagando salários em dia para todos os funcionários, num país complicado para o empreendedorismo como é o Brasil… Mas hoje só tem duas ou três agências de turismo mais antigas que a Agaxtur no mundo inteiro. Então chegamos a um patamar impressionante. 70 anos entregando todas as viagens. É muito tempo…

EMPRESÁRIO DIGITAL Vocês são conhecidos pela gestão humana e a sustentabilidade. Por quê?

ALDO LEONE FILHO A Agaxtur sempre teve uma gestão humana. Foi chamada pelos funcionários de uma excelente empresa para se trabalhar, e isso numa estrutura familiar. E também sempre tivemos essa preocupação com a sustentabilidade, não apenas do ponto de vista ecológico, mas também voltado às pessoas que trabalham. Além disso, sempre fomos uma empresa de diversidade, muito aberta, e hoje, a partir dessa união com o grupo Águia Branca, a gente faz parte de programas de ESG muito mais parrudos. Estamos na liderança desse setor em termos de ESG no Brasil.

EMPRESÁRIO DIGITAL Qual é o propósito da empresa?

ALDO LEONE FILHO O nosso propósito é servir o passageiro. Transmitir um sentimento de alegria, de felicidade… O que meu pai queria quando fundou essa empresa é atender bem as pessoas, que elas tivessem uma experiência acima da expectativa delas. Hoje de manhã, por coincidência, um médico me ligou para dizer que o hotel em que ficou em Madri era sensacional. Ouvir esse tipo de agradecimento, de elogio aos nossos serviços, é o que mais nos satisfaz

EMPRESÁRIO DIGITAL Como você definiria o seu estilo de liderança?

ALDO LEONE FILHO Minha liderança é leve. Gosto de dar espaço para as pessoas, acredito no potencial delas… até o dia em que elas me decepcionam. Tenho o turismo na veia. Quando uma pessoa me liga à meia-noite e pergunta se está me atrapalhando, só respondo que não, porque esse é meu trabalho. Meu trabalho não é das 9h às 18h. Meu trabalho é atender aquele passageiro.

EMPRESÁRIO DIGITAL Qual foi a estratégia de negócio da empresa por trás dessa aliança societária com a Águia Branca?

ALDO LEONE FILHO O futuro do mundo é a consolidação. Claro que ter uma lojinha nos anos 1950, numa esquina de Santos, atendendo três clientes, é um projeto inicial. Depois você tem um novo mundo. E o mundo hoje é o da consolidação, do poder econômico, é da tecnologia profunda e cara.

É um privilégio participar de um grande grupo como a Águia Branca. O turismo no mundo é feito por grandes grupos. A hotelaria hoje faz parte de um mesmo grupo. Você tem companhias marítimas hoje com até 40 navios, e todas fazem parte de quatro grupos no mundo. Na aviação é a mesma coisa, não existe mais turismo solo no mundo. Então a gente precisava se alinhar a isso, os pequenos tendem a sumir, precisamos vivenciar esse mundo de hoje, não ficar no passado.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como vê o futuro do setor e sua própria empresa nesse contexto?

ALDO LEONE FILHO Existe um lado que acha que o digital vai tomar conta de tudo. Na verdade, isso já aconteceu. Ele está no seu celular, computador, carro… Mas a tendência do turismo é você continuar viajando. É perigoso viver nas grandes capitais hoje, então as pessoas precisam levar a cabeça para descansar. Se todo mundo vai viajar, alguém vai vender essa viagem: o agente de viagem, que somos nós. Eu vejo um futuro em que você vai achar uma Agaxtur para preparar a sua viagem em qualquer lugar.

EMPRESÁRIO DIGITAL A inteligência artificial pode ser seu aliado ou atrapalhar sua operação?

ALDO LEONE FILHO Em 1993 eu tinha um computador e praticamente só ficava vendo fotos da Lua na internet. Hoje ela domina tudo. A IA já existe, ela simplesmente vai mudar o jeito de a gente pensar. E vai ajudar a gente também. Semana que vem, estou fazendo um roteiro para a Romênia, Sérvia, Bulgária, Croácia e Hungria. É bom que a IA me ajude. Porque eu não sei falar romeno nem sérvio, não sei em que dia Belgrado foi fundada nem sei qual a principal igreja de Budapeste. Mas você acha que um turista vai usar a IA para descobrir qual é o castelo bacana de Praga? Para quê? Deixa o profissional fazer isso e entregar a viagem pronta para você. Então a IA vai ajudar muito mais o agente de viagem do que o viajante.

EMPRESÁRIO DIGITAL O que é preciso para se manter nesse nível de atendimento?

ALDO LEONE FILHO Nós somos criadores de destinos e precisamos acompanhar a moda. Qual é o destino da moda hoje? África do Sul. Porque acabaram de ser lançados dois voos para lá. E é um dos destinos mais bonitos do mundo. Você acabou de ter uma moda gigante de ir para o Qatar, porque teve uma Copa do Mundo lá e todo mundo que eu conheço quis ir. Hoje ninguém quer. Durante a pandemia, muita gente queria ir para o Egito, porque era um dos poucos países abertos a receber turistas. E quanto custa isso? Cada viagem tem um bolso. Nossa vida é isso, é descobrir qual será a moda e começar a vender.

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Outubro 2024

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