Comprar & Amar

Referência incontornável entre as marcas de roupa que unem criatividade, acabamento e preços acessíveis, a C&A, presidida pelo executivo Paulo Correa, vive em constante reinvenção – agora cada vez mais tecnológica. Exatamente como o mercado em que tem sido, há quase 50 anos, um farol para clientes, fornecedores e concorrentes. Entenda.

Uma das maiores redes de varejo do mundo, a C&A tem tanta presença no imaginário do consumidor nacional que temos a impressão de que ela nasceu aqui mesmo. Mas não. A marca é holandesa, foi criada no século 19 e chegou ao Brasil nos anos 1970. Essa longevidade da companhia faz parte da sua própria cultura, que incentiva o desenvolvimento de carreiras longas na organização.

É o caso de Paulo Correa, CEO da empresa no país há quase dez anos. Desde 2015, esse executivo tem encarado o desafio de manter a essência da C&A, que é oferecer o melhor da moda a preços acessíveis, ao mesmo tempo em que incorpora inovações que passam por processos e tecnologia, para deixar a empresa na vanguarda de um varejo competitivo e versátil como o de vestuário.

Para se ter uma ideia, hoje um consumidor pode comprar à tarde uma roupa no site da C&A pensando no que vai vestir numa festa à noite, pois a empresa tem condições de entregá-la em duas horas.

“O mais relevante, principalmente na indústria da moda, é você ter essa capacidade de traduzir o que as pessoas querem, as tendências que se adaptam aos diversos corpos, necessidades e gostos”, sintetiza o executivo.

Saiba mais das novidades da C&A e da trajetória profissional singular de Paulo Correa na entrevista exclusiva a seguir.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como foi sua trajetória até chegar ao posto mais alto da C&A no Brasil?

PAULO CORREA A minha história tem algumas particularidades muito interessantes, porque eu fiz engenharia de produção, nunca pensei em trabalhar com moda na vida. Na faculdade havia um painel com ofertas de estágio, e eu consegui um numa fábrica de mochilas no Rio de Janeiro. Era a Company, muito forte nessa moda jovem. Comecei numa linha de produção, depois fui trabalhar em planejamento. Eu tive uma carreira de quase 12 anos nessa empresa, passando por várias funções.

Nos últimos anos, fui para o varejo e tive duas franquias dessa marca em Salvador.
A partir dali, decidi construir uma outra história: acabei desmontando toda a minha vida profissional para morar dois anos nos Estados Unidos. Fui para a Carolina do Norte, fazer um MBA. Quando voltei, vim trabalhar numa empresa de consultoria estratégica chamada McKinsey. Fiquei lá por quase três anos, sempre em projetos ligados a varejo e consumo. Depois disso, tive uma breve passagem pela Xerox, e no final surgiu um projeto que a McKinsey estava fazendo aqui na C&A. Eles ficaram sabendo que eu já tinha vivido a indústria da moda, já tinha experiência com consultoria, então seria a pessoa mais indicada para uma nova área na empresa, que era a de projetos. Isso foi em 2004, quando tive de mudar do Rio para São Paulo.

EMPRESÁRIO DIGITAL E como foi essa construção da carreira já na C&A?

PAULO CORREA Comecei na divisão masculina, até que, cerca de dois anos depois, assumi a área comercial como um todo. E então fui abraçando mais áreas: marketing, supply… A área comercial ganhou tanto espaço que, em 2015, fui convidado para ser o CEO da companhia. Conquistei a oportunidade de liderar o negócio dessa empresa, que é fantástica em diversos aspectos. Apenas quatro anos depois, em 2019, tive a honra de fazer o IPO da companhia, a primeira empresa do grupo no mundo que abriu capital para terceiros. E olhe que tudo começou com um anúncio de estágio na faculdade, o que me levou a essa carreira maravilhosa no segmento da moda.

EMPRESÁRIO DIGITAL A empresa está no Brasil desde 1976. Como você explica essa longevidade?

PAULO CORREA Realmente, a operação já tem quase 50 anos aqui no Brasil, e sempre com essa capacidade de se reinventar. Mas, quando a gente conhece a história da C&A no mundo, então percebe melhor a força do que isso significa de fato. A empresa foi fundada em 1841, por dois irmãos, Clemens e August, daí o nome C&A. Eles eram vendedores de tecido, numa jornada que faziam entre a Holanda e a Alemanha, até que um dia entenderam que era possível fazer casacos de lã a um preço acessível para as pessoas daquela região, gente que trabalhava prioritariamente nas fazendas. Assim, conseguiram dar acesso a um item que era muito importante, principalmente no inverno, para esse público que ficava nas estradas, entre essas fazendas, e a um preço viável para todos. Então, quando eu olho para trás, vejo que mantivemos o propósito da origem da empresa, que é tornar o melhor da moda possível e acessível para as pessoas.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como se manter relevante ao longo de todo esse tempo?

PAULO CORREA Tornar acessível o melhor da moda aqui no Brasil traduz bastante o que é esse princípio que norteia a companhia há quase 200 anos. Imagine que é uma empresa que já passou por duas guerras mundiais, uma enorme recessão, a grande depressão lá de 1929, atravessou muitos governos no Brasil, diversos planos econômicos, inflação, controles macroeconômicos, crises de vários tipos, e continua fortíssima, continua muito relevante, continua muito atual.
Eu acho que, por trás disso tudo, tem alguns elementos da cultura que são muito importantes. Um deles é essa paixão pelo cliente e pela moda. Na medida em que o seu olhar está sempre focado no comportamento da sociedade, conseguimos entender o que o consumidor gosta ou não, o que está valorizando, quais tendências são realmente relevantes para o público, e então você naturalmente se reinventa, porque vai estar sempre redirecionando para o entendimento do cliente do que é moda naquele momento. E isso faz com que a C&A se regenere continuamente.

EMPRESÁRIO DIGITAL Quais são os valores fundamentais que guiam a operação e a cultura organizacional da C&A no Brasil?

PAULO CORREA Há alguns elementos nesses valores que são contemporâneos e já muito presentes, contribuindo para guiar a companhia nessa jornada de grande transformação do mundo atual.
O primeiro deles é essa dimensão do respeito às pessoas. Esse fator aqui é inegociável. Assim como a ética. Uma pessoa gritar numa reunião com outra, desvalorizar o trabalho de outra pessoa, xingar uma pessoa, são atitudes inadmissíveis. Acabou. É game over. Pode sair. Não tem continuação. Estamos sempre valorizando o bom comportamento, e isso está muito enraizado na forma que todo mundo se relaciona aqui dentro. Acaba sendo um ativo muito importante porque esse respeito entre todas as pessoas e essa forma de fazer negócio de uma maneira ética fazem com que líderes como eu possam botar a cabeça no travesseiro tranquilos. E ao mesmo tempo se sintam renovados todos os dias para vir ao escritório. Não é à toa que muita gente fica aqui tanto tempo, as carreiras são longas, incluindo pessoas que saem da C&A e voltam, pedem para voltar. Eu mesmo tenho 20 anos de companhia, e minha jornada continua tão intensa e feliz quanto quando comecei.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como a C&A tem enfrentado os desafios e oportunidades trazidos pela transformação digital?

PAULO CORREA Em uma empresa que tem a reinvenção no seu DNA, a transformação digital trouxe mais um elemento para fortalecer esse direcionamento. Os brasileiros adoram moda, ter acesso à moda a um preço que possam pagar. E a transformação digital traz muitas possibilidades de você fazer isso de um jeito ainda mais poderoso, mais personalizado, mais relevante para as pessoas. Então entendemos que esse processo era uma transformação da própria C&A, da forma como ela opera e entrega as suas histórias para os seus clientes. Isso se passa desde a criação das coleções. Eu brinco que a gente tem o nosso Tinder de estampa, uma história muito bacana que surgiu ao longo da pandemia, em que o nosso time propõe digitalmente uma série de estampas e usa um painel formado tanto por clientes quanto por associados. Essas pessoas apontam quais gostam e não gostam. As estampas que as pessoas mais gostam são as que a gente produz. Então, de fato, a digitalização permite que o cliente possa participar diretamente do processo de desenvolvimento das coleções.

E isso traz mais relevância. Além disso, à medida que eu consigo construir estatisticamente quais são as pessoas que mais predizem o que de fato vai ser a preferência do público como um todo, consigo refinar esse painel. Esse é um pequeno exemplo de como a digitalização está transformando a forma como fazemos negócio aqui hoje, desde escolher produto até decidir que preço vamos colocar nele, qual sortimento precisamos ter em cada loja, passando por todas as áreas do negócio.

EMPRESÁRIO DIGITAL Quais são os diferenciais da C&A em relação à experiência do cliente?

PAULO CORREA É uma escuta ativa e genuína das preferências e necessidades dos nossos clientes. Um exemplo disso foi o que aconteceu no início de 2023. Numa reunião com os nossos investidores, estávamos apresentando os resultados, e eu falei que, com base no que vínhamos conversando com nossos clientes, num momento de recessão, bolso curto e de redes sociais, a importância de peças com uma percepção de qualidade e uma versatilidade maiores ficou muito grande. Combinamos que o nome do jogo agora era versatilidade. A consumidora deve ter um look à disposição que ela possa usar no churrasco no final de semana com os

amigos, mas ao mesmo tempo que ela possa sair com o namorado e até, dependendo do ambiente de trabalho, ir para o escritório. Um look que seja versátil para várias ocasiões diferentes. Saímos na frente e conseguimos ter, de fato, um volume de sortimento muito mais versátil. E o feedback tem sido superpositivo.

EMPRESÁRIO DIGITAL As redes sociais mudam a relação do consumidor com a roupa?

PAULO CORREA Sim, num momento de redes sociais tão intenso e tão ativo, as pessoas querem postar um look que elas estão gostando, com o qual estão se sentindo bem, ou daquele evento que participaram. E alguns looks geram uma percepção de “já vi”. Então a pessoa não quer postar. São nuances importantes que estão acontecendo no comportamento das pessoas, e o nosso papel é conseguir traduzir essas necessidades nas coleções que oferecemos.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como a C&A tem lidado com as questões relacionadas à sustentabilidade e à responsabilidade social corporativa em suas operações no Brasil?

PAULO CORREA A C&A tem, dentro do seu DNA, essa crença de que podemos ser uma força para o bem. O bem para transformar o meio ambiente e o bem para transformar a forma como nos relacionamos com a sociedade. Isso já é de longa data; muito antes de eu chegar aqui, isso já existia dentro do conceito do próprio negócio. Se você pensar, lá na Europa, os temas ligados à sustentabilidade são mais avançados do que no Brasil. A C&A, na Europa, já tinha vários programas nesse sentido. Então, não é à toa que temos iniciativas inovadoras, como ser a única empresa no Brasil que tem, de fato, um jeans que é 100% circular. Ganhamos prêmios por conta disso. Nossos clientes têm a oportunidade de levar peças para as lojas C&A, depositar nos nossos pontos de coleta, e essas peças são reprocessadas, a fiação é feita de novo, refazemos o processo do tecido do jeans e construímos novas peças para vender nas lojas físicas.
Na malharia, temos camisetas compostáveis. Você as coloca na composteira e, em 12 semanas, elas vão se decompor e ter uma adaptação dentro do ciclo normal da natureza. Não temos essas práticas como marketing, mas como crença. Há um índice de transparência da moda que teve seis edições, e nas seis a C&A foi considerada a número 1 do ranking. Este ano entramos no ISE, que é o índice de sustentabilidade empresarial da bolsa de valores.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como a empresa aborda a gestão de talentos e desenvolvimento de liderança?

PAULO CORREA A C&A tem um programa de trainee muito famoso, há pessoas que lideram várias organizações de varejo no Brasil que foram formadas aqui na C&A. E, dentro do management da C&A, tem profissionais, como eu, com mais de 20 anos de companhia. E isso tudo está bem fundamentado nessa dinâmica de liderança. Os valores de respeito e ética são muito fortes. A dinâmica de liderança aqui é algo muito sério: tem avaliações, planos de desenvolvimento, mentorias, feedback contínuo, processos formais de desenvolvimento do gestor, planos de sucessão… Esse pacote de atividades é importante não só para as pessoas, que têm oportunidade de desenvolver carreira aqui dentro, mas para o fortalecimento da cultura da C&A.

EMPRESÁRIO DIGITAL Como a C&A tem trabalhado para fortalecer suas parcerias com fornecedores e garantir uma cadeia de suprimentos sustentável e ética?

PAULO CORREA É importante ressaltar que a construção dessa história da C&A só é possível a partir de todos os parceiros que estão juntos conosco nessa caminhada. Como os nossos fornecedores. Temos mais de 300 aqui no Brasil, fora os internacionais, na Ásia, e a participação deles dentro dessa jornada é absolutamente fundamental. Transformar um conceito, uma tendência, num produto de desejo, mas que caiba no bolso das pessoas, é uma arte, não é uma história óbvia. Por isso, tentamos nos cercar de parceiros e fornecedores que embarcam conosco nesse propósito e nessa jornada. Buscando sempre trazer uma alta percepção de valor para os nossos produtos. E isso exige uma pesquisa constante de alternativas de tecidos, de aviamentos, de processos de fabricação… Uma reinvenção também contínua dessa base de fornecedores. Um exemplo disso é esse modelo de distribuição que temos agora, chamado “Push and Pull”. Por meio de algoritmos, vamos lendo qual é o nível de demanda esperada de um determinado produto, em cor e tamanho. Então, quantas camisetas pretas tamanho M eu vou vender na minha loja do Iguatemi de Alphaville nas próximas quatro semanas? Quando você faz isso, olhando para o que tem no estoque e sabendo quanto tempo leva para produzir essa camiseta preta tamanho M, você vai fazendo com que essa integração tenha de chegar até o fornecedor.

Para que ele, de fato, entenda que está na hora de produzir mais cem camisetas pretas tamanho M para nós. Mas essa parceria não pode ser só quantitativa, ou só financeira, ou só de produto.
Ela tem um jeito de ser. Todo fornecedor, para ser cadastrado da C&A, precisa cumprir com nosso contrato de fornecimento. Ele tem cláusulas que abrangem o impacto no jeito de produzir, como são descartadas as peças que não vão ser utilizadas, o tratamento de efluentes, a utilização de produtos químicos autorizados… Temos uma estrutura que faz auditorias frequentes em todas as oficinas cadastradas de nossos fornecedores, para garantir que nossos princípios, de respeito, de ética, de segurança, de sustentabilidade, sejam aplicados em todas as peças que são feitas pela C&A.

EMPRESÁRIO DIGITAL Quais são os planos da C&A para expandir sua presença no mercado brasileiro nos próximos anos?

PAULO CORREA A C&A tem planos bastante ambiciosos de crescimento. Tivemos, nos últimos trimestres, o maior crescimento dentro da nossa indústria, e pretendemos continuar avançando. A C&A tem um portfólio de 330 lojas, com uma localização muito premium, em shopping centers e locais estratégicos das cidades. Como são lugares diferentes, com contextos distintos, usamos inteligência artificial para ajustar os preços à medida que a demanda acontece em cada loja. E mergulhamos em jornadas omni, de fato, cada vez mais interessantes.

O aplicativo pode nos ajudar a ter uma jornada na loja física mais atraente ou fazer com que essa loja proporcione uma compra muito mais rápida para clientes online, com entregas de até duas horas. O cliente que tem uma festa hoje pode comprar a roupa no site e recebê-la em poucas horas.
Ainda no âmbito digital, lançamos o cartão C&A Pay no final de 2021. O cartão é totalmente digital, então não tem plástico. Você precisa pagar só com o seu sorriso. Não tem de lembrar senha, você simplesmente compra com reconhecimento facial, o que traz um processo mais seguro tanto para o consumidor como para quem está vendendo.
E, a partir de exemplos como esses, vamos tendo uma conversão e um fluxo maiores, o que gera uma venda maior por metro quadrado e um crescimento para a companhia cada vez mais forte.

Este ano, temos um plano de desenvolver um novo conceito de loja, nosso canal online também está sendo reconstruído, e tudo em função de lidarmos com números cada vez maiores. Hoje temos mais de 5 milhões de pessoas com o C&A Pay, mais de 26 milhões de pessoas no nosso programa de relacionamento, e todo mês 3 milhões de pessoas usam nosso aplicativo. São números grandes, que demandam essa reinvenção constante para que nossa estrutura dê conta de um público consumidor tão vasto e fiel.

Mais em

Outubro 2024

Publicidade

Newsletter

Ao se cadastrar você declara concordar com nossa Política de Privacidade.