Guru da economia em programas da TV Globo, da Jovem Pan e no portal InvestNews, Samy Dana aponta o risco de deixar de investir durante a pandemia. E afirma: o governo deve ajudar os empreendimentos competitivos
Como as empresas devem agir neste momento de crise generalizada? Quanta cautela é necessária? São questões que o Brasil todo vem se fazendo, mas muitas respostas surgem mais na base de feeling que em dados concretos. Que tal, então, perguntar a um especialista em economia, tão celebrado que se tornou, nos últimos anos, a referência de aconselhamento para programas de TV e a mídia em geral sobre uma das questões mais importantes de todos os tempos: o que fazer com o seu dinheiro?
A reportagem de Empresário Digital, então, foi conversar com Samy Dana, que ficou popular no país inteiro por seus comentários sobre economia para o Jornal da Globo e o SPTV, além do Em Pauta, da Globo News, e por sua participação em dois programas da rádio Jovem Pan: Pânico e Jornal da Manhã.
Com mais de 15 anos de experiência em consultorias e palestras, esse professor de economia da Fundação Getúlio Vargas, autor de mais de dez livros, agora tem seu próprio programa no portal de internet InvestNews: é o Cafeína, em que comenta notícias do mundo da economia e das finanças ao lado do apresentador Dony De Nuccio (ex-Jornal Hoje).
Recentemente, Samy Dana virou personagem de uma polêmica nacional ao encabeçar um estudo matemático sobre a pandemia do coronavirus, que muitos empresários e políticos aproveitaram como argumento para defender a flexibilização das medidas de isolamento social – na contramão do que as autoridades de saúde vêm recomendando. Já em uma atualização do estudo, baseada nos últimos dados oficiais e anunciada no Cafeína em 28 de maio.
Samy foi categórico: a situação ainda é muito grave no país, e medidas de reabertura na cidade de São Paulo, que concentra os maiores índices de contágio e mortes, são iniciativas muito precoces. E perigosas. Mas, voltemos à economia. Com você, a seguir, os insights e reflexões de um dos pensadores mais instigantes do Brasil atual.
“A economia nada mais é do que a relação humana, a teoria das escolha sem um universo de alguma escassez: de tempo,de dinheiro,de água…”
Samy Dana
EMPRESÁRIO DIGITAL – Você tem mestrado em Economia e doutorado em Administração. Como tem sido levar esse conhecimento para canais de comunicação populares, como o Pânico e o SPTV?
SAMY DANA – A economia é algo do dia a dia, não pode ser vista como uma coisa distante. Por que a gente compra certos tamanhos de pipoca e não outros? Tenho até um texto sobre isso. Por que a gente cai em certas promoções que um pouquinho de reflexão mostraria que não são tão vantajosas? É o ser humano! A economia nada mais é do que a relação humana, a teoria das escolhas em um universo de alguma escassez: de tempo, de dinheiro, de água…
ED – Como tem sido para você essa nova experiência de apresentar um programa na plataforma InvestNews?
SAMY DANA – InvestNews é um grande projeto. Em quatro meses, a gente já ultrapassou 100 mil seguidores. É um prazer trabalhar com o Dony, ele é meu amigo há dez anos, meu melhor amigo, confio plenamente nele, na capacidade de comunicação, na capacidade intelectual… e ele foi me orientando em relação a esse papel. É muito legal oferecer um canal de finanças feito por gente que teve prática de fato com essa atividade.
O Dony trabalhou muitos anos no mercado financeiro, ele tem mestrado em economia. É ótimo e diferente porque você vê muitos jornalistas que falam sobre economia, mas não necessariamente entendem. Pior ainda é o caso dos youtubers, que comentam de um jeito bem humorado, mas, com honrosas exceções, não têm a mínima ideia do que estão falando.
ED – De maneira geral, as pessoas também não fazem a menor ideia do impacto de ter juros altos ou baixos no país, de que ter preços caindo no mercado (deflação) pode ser uma péssima notícia… nem entendem a maior parte do que o William Bonner fala quando o assunto é Taxa Selic, Copom, o que faz um Banco Central… Essa ignorância é só aqui ou na Europa e EUA é assim também?
SAMY DANA – O ser humano é irracional, e isso serve para todos os lugares. Mas, aqui no Brasil, por conta da má educação, da baixa escolaridade, tudo se agrava. Na escola, a gente tem matéria de biologia, química e física, que também são importantes, mas não tem uma disciplina de finanças, para preparar o cidadão para a vida. Daí essa falta generalizada de conhecimento.
ED – Por que sempre tem tanta gente endividada? Gastar mais do que se tem é uma característica humana?
SAMY DANA – Sim, tem gente que diz que isso está até no nosso DNA: você sempre aproveita o hoje, porque o amanhã é incerto. Mas aproveitar o hoje, muitas vezes, é comprometer um futuro. O risco é grande, principalmente no caso de um mercado em que você pode antecipar seus ganhos futuros, pegar empréstimos, consumir mais do que deveria. Com educação financeira e com informação, você conseguiria formar pessoas mais preparadas. Meu trabalho vai muito nesse sentido.
ED – A análise preditiva funciona para um empresário tomar decisões. Como os algoritmos podem ajudar as empresas num cenário de crise pandêmica?
SAMY DANA – O planeta se transformou num mundo de ciência de dados. Mas as pessoas ainda estão num nível muito baixo. Acham que você vai misturar um monte de variáveis, como se estivesse usando um liquidificador, e daí vão sair as respostas que você quer. Não é assim. Por isso, acho que essa é uma área que ainda vai crescer muito. Eu já fiz probabilidade do Oscar, de Big Brother Brasil, fiz probabilidade da pandemia recentemente.
A gente trabalha com incerteza, mas não é por isso que todos os cenários vão ter as mesmas probabilidades.O meu filho tem 4 anos. Assim que ele aprender a ler, vou colocá-lo para aprender programação. Acho que isso será cada vez mais importante.
ED – Investir num momento de crise é uma recomendação possível?
SAMY DANA – Nem sempre é porque investiram errado que as empresas acabaram quebrando. Muitas quebram porque deixaram de investir e acabam sumindo do mercado. Eu me lembro de uma frase do ex-CEO da Nokia: “Não fizemos nada de errado, porém, de algum modo, nós perdemos” [o executivo Stephen Elop disse isso em 2013, na ocasião da compra da Nokia pela Microsoft].
Não tomar uma decisão é a decisão de não fazer nada, e pode ser complicado. Claro que, se eu pudesse escolher, eu escolheria não ter crise, porque essa pandemia deixa todo mundo mais pobre. E isso também aumenta a chance de uma empresa sumir. Então, ficar parado, esperando, pode ser fatal.
ED – As empresas podem contar com os estímulos do governo, no Brasil, para se manter durante essa crise do coronavírus?
SAMY DANA – Eu acredito que alguns negócios precisam, sim, de ajuda do governo. Vamos pensar numa empresa de turismo. Ela vende pacotes de viagem, ela é competitiva e paga seus funcionários em dia. Daí vem uma pandemia, ninguém mais viaja, ela não tem mais dinheiro. Mas ainda tem de pagar funcionário, pagar aluguel – imagine se ela tiver uma loja num shopping, então, onde o aluguel é alto… Ela vai ter de pagar tudo isso, mas não tem mais faturamento.
Então, ajudar essas empresas pontualmente é interessante, porque em algum momento elas vão voltar a ser competitivas. O que não dá para apoiar, e muita gente está se aproveitando da situação, é ficar ajudando empresa que não para em pé. A gente faz muito isso no Brasil a título de gerar empregos. Isso é um erro complicado, pelo qual todo brasileiro acaba pagando. É óbvio que esse dinheiro que vai ser gasto agora por conta das consequências do vírus vai custar em breve para todos nós – seja por meio de reformas, de aumento de impostos… Dinheiro sempre tem contrapartida.
ED – Do ponto de vista da economia, esta crise só tem notícia ruim ou dá para enxergar algum aspecto positivo em alguns cenários?
SAMY DANA – A análise inescapável é que todo mundo vai sair mais pobre dessa crise associada à pandemia. O que podemos avaliar como positivo é que muita gente acabou aprendendo a trabalhar de home office, um modelo que pode permanecer. E as pessoas estão buscando conhecimento de como usar melhor a tecnologia. Conheço diversas pessoas de uma certa idade que não sabiam nem usar aplicativo de banco, pagar conta pelo computador, e agora estão aprendendo. O saldo, claro, vai ser extremamente negativo, sob todos os aspectos, mas é certo que muitos aprendizados permanecerão e tornarão alguns cenários, ou hábitos, melhores do que eram antes.