Referência em pós-produção de imagens digitais, Lucas Rosa transcende as expectativas das maiores marcas do Brasil com um trabalho fundamentado em sua perspectiva única de artista visual.
O pôster do filme que você quer ver. A imagem na revista de um sanduíche que imediatamente nos dá água na boca. Uma imagem digital capaz de reter sua atenção e te levar de um estado de indiferença para outro de vontade de consumir. E mais: admirando a criatividade de cada uma dessas peças.
Há um fotógrafo por trás do início de um processo que culminou nessa imagem impactante. Mas há, sobretudo, uma manipulação dessa imagem, que, dependendo do profissional envolvido, pode transformar uma peça de publicidade numa arte digna de estar na parede de museus. É o caso quando o artista visual que recriou essa imagem se chama Lucas Rosa.
Um mago do Photoshop, Lucas é uma referência incontornável quando se trata de pós-produção de imagens digitais. Tem um escritório em São Paulo que já atendeu as marcas mais relevantes do Brasil, gente que enxerga, em cada peça trabalhada por esse paulista de Franca, uma assinatura única, que sempre transcende o objetivo publicitário, aproximando-o de uma obra de arte.
Todo profissional interessado em trabalhar com design e arte digital precisa conhecer o processo criativo e a visão de Lucas Rosa sobre a grandeza que pode ser inserida em cada projeto via Photoshop. Ou via outras ferramentas também. Afinal, como ele explica nesta entrevista exclusiva, a arte está na sua mente. Não importa o recurso com o qual você vai expressá-la.
EMPRESÁRIO DIGITAL Quais as diferenças entre ser um designer e um artista digital?
LUCAS ROSA A diferença está na abrangência da percepção da ferramenta e da criatividade sobre determinado projeto. O artista visual não pensa somente na forma como a ferramenta o auxilia, mas em todo o leque de soluções, criatividade, gestão e abrangência. A arte não é só ligada ao resultado ou à imagem em si como objetivo final. A mensagem ultrapassa a visão do artista; ela é comunicada pela visão de quem a recebe. Quando você fala em vender uma arte, isso envolve sedução, valorização da obra, criação… e também a participação do designer, do retocador, do fotógrafo… O artista precisa ter conhecimento sobre tudo isso. Quando ele se prende somente à ferramenta ou à profissão, fica limitado a uma parte de um contexto. Quando você aproxima uma comunicação do que a arte é, você atinge os pontos necessários para ser bem remunerado e reconhecido no mercado.
EMPRESÁRIO DIGITAL Fale um pouco sobre os caminhos que te levaram ao reconhecimento que você tem hoje.
LUCAS ROSA Sempre fui muito curioso desde criança. Sempre gostei de desenhar e de perceber como as coisas se encaixavam, e não só como elas existiam. Se a gente for pensar em 30 anos atrás, a arte digital era um mercado obscuro ainda. A gente vivia num processo completamente analógico. E eu cresci com essa percepção das coisas, não imaginava que um dia eu me tornaria o profissional que eu sou hoje graças à arte e graças ao Photoshop, que é um software que me dá total liberdade de colocar para fora tudo aquilo que tem na minha mente.
Cresci numa família muito tradicional, meus pais têm uma linha rigorosa, queriam que eu fizesse Direito ou Medicina, ou Engenharia… Mas isso nunca encaixou na pessoa que eu era. Minha infância toda foi muito ligada a jogos e ao computador. Em 2002, meu pai me deu um computador e minha vida era basicamente isso: eu voltava da escola e ficava jogando o dia inteiro. Por estranho que pareça, foi essa vivência nos jogos que me levaria ao Photoshop.
EMPRESÁRIO DIGITAL Como assim? Como foi essa transição?
LUCAS ROSA Foi assim: eu era um cara empenhado, estudava bastante sobre o jogo Age of Empires e, para compartilhar meus resultados num fórum de internet específico desse jogo, era necessário printar a tela que indicava o nível em que eu estava e o ranking mundial. E eu cheguei a ser o sétimo melhor jogador do Brasil na época. Mas estava longe dos resultados de jogadores do exterior. Aí eu tive a ideia de manipular meus resultados no jogo. O computador que meu pai me deu era usado, e o antigo dono havia instalado o Photoshop 7.0. Aprendi a mexer no programa justamente para alterar a imagem do meu resultado no jogo e mostrar no fórum. Esse foi o primeiro momento em que eu tive um sentimento de liberdade de expressão. Pela primeira vez percebi que eu conseguia fazer com que as pessoas enxergassem aquilo que eu queria que elas enxergassem, não necessariamente o real. Mais tarde, quando comecei a trabalhar nessa área, reencontrei esse sentimento: o de expressar para as pessoas uma perspectiva que é sua e que é única.
EMPRESÁRIO DIGITAL Foi esse momento lúdico da adolescência, então, o que te levou ao Photoshop?
LUCAS ROSA Sim, eu logo me apaixonei e comecei a buscar tudo o que havia na internet a respeito do Photoshop. Mas não existia ainda nada muito aprofundado. Até que, dois anos depois, descobri um evento em São Paulo chamado Photoshop Conference, que reunia artistas digitais em ascensão, profissionais que palestravam durante três dias, compartilhando técnicas, percepções e bastidores. Eu, que sou de Franca, interior do estado, vim para a capital participar desse evento, e foi um momento disruptivo para mim, de descobrir o que eu queria fazer na vida. Era como se eu chegasse a um espaço e lugar que falava minha língua, e olhe que eu era uma criança de 14 anos. Estava numa sede enorme de aprendizado e saí do evento maravilhado, mas também perdido porque, quando tudo é muito novo também é muito inseguro. Só que foi o momento de uma comprovação: de que realmente havia um caminho que eu poderia seguir e que não era ilusório. Existia, sim, um mercado em ascensão.
EMPRESÁRIO DIGITAL Você disse que seus pais são muito tradicionais. Qual foi a reação deles?
LUCAS ROSA Eles foram completamente contra. Meu pai dizia “você nunca vai ganhar dinheiro trabalhando com desenho”. Essa foi uma frase muito marcante. Mesmo assim, voltei ao evento no ano seguinte. E no seguinte… Nesse terceiro, já vim mais preparado para o evento. Comecei a vender as ilustrações que eu fazia na época para ganhar um dinheirinho e também mostrar para os profissionais que estavam ao meu redor naquele momento. Conheci um fotógrafo muito renomado, Clicio Barroso, e pedi uma chance para trabalhar com isso. Trocamos Twitter e, quatro ou cinco meses depois, ele me mandou uma mensagem dizendo que haveria um workshop dele em São Paulo e que eu poderia ser ajudante, arrumando a sala, distribuindo crachás… Vim e no terceiro dia de workshop surgiu uma oportunidade de emprego num estúdio especializado em fotografia de comida. Na hora da entrevista, eu era o mais novo de lá: tinha 16, enquanto os outros eram profissionais com mais de 20, 30… lembro de um cara de 46 anos, foi bem assustador.
EMPRESÁRIO DIGITAL E como foi esse processo?
LUCAS ROSA Eles me deram uma imagem para ver se eu estava apto para a vaga. E eu fui o pior, sem a menor dúvida. Mas, para minha surpresa, me pediram para voltar no dia seguinte com mais dois concorrentes. E então me pediram para voltar no seguinte, e no seguinte… no quinto dia os donos do estúdio me chamaram e perguntaram por que eu estava ali. Eu disse que aquilo era minha vida, meus olhos estavam brilhando. Aí eles disseram que a vaga podia ser minha. Foi um momento de êxtase. Pela primeira vez eu tive uma valorização do que eu queria fazer, algo que eu nunca tive dentro de casa. Só que não deu certo dessa vez.
EMPRESÁRIO DIGITAL Por quê?
LUCAS ROSA Quando eu fui comunicar isso para minha família, meu pai barrou. Disse que eu tinha uma série de oportunidades que ele poderia proporcionar, e eu estaria (aos 16 anos, ainda sem faculdade) abrindo mão de tudo isso para trabalhar na incerteza, com Photoshop, “viver de desenho”. Foi uma ducha de água fria. Comuniquei ao estúdio que não poderia ficar, inventei desculpas. Mas aquilo serviu como uma virada de chave. Eu soube que em algum momento eu me tornaria independente e voltaria. Mesmo que isso representasse uma queda de braço com meus pais. Por causa deles, fui fazer engenharia da computação. Eu ia muito frustrado para a faculdade, matava todas as aulas para ir à biblioteca ler sobre história da arte, fotografia, qualquer coisa que me ligasse àquele momento no estúdio que eu tinha vivido. Foram três anos de muita revolta, e eu estava juntando todo o dinheiro que eu pudesse para voltar a São Paulo. Aí, no terceiro ano, larguei a faculdade, bati na porta do estúdio e perguntei se podia voltar. Eu havia mantido contato ao longo dos anos com o Meca Assumpção, dono do lugar, e ele topou. Mas não voltei na vaga de manipulador de imagens, fui ser assistente do estúdio, que era um faz-tudo, desde office boy a pintar fundo infinito, carregar tripé… Até que cheguei a trabalhar com imagens.
EMPRESÁRIO DIGITAL Deve ter sido um momento muito marcante.
LUCAS ROSA Sim, sempre senti do Meca e da Silvana, esposa dele, muita confiança. Me deram a valorização profissional que minha família não me deu. Aí virava noites no estúdio, minha energia era toda voltada a aprender. O Meca é um artista visual de mão cheia, e ele explicava tudo da melhor forma possível para as pessoas que estavam ali. O Photoshop nessa época estava ganhando muita força, a fotografia digital estava crescendo, e ele pediu para eu pegar as imagens dele e levar para um nível de manipulação diferente do que o estúdio fazia até então. Foi quando eu comecei a realmente mergulhar fundo nesse software, com a orientação de um artista muito gabaritado. Então evoluíram todas as minhas percepções sobre cor, luz, enquadramento, composição… Era a faculdade que eu queria ter feito. Fiquei lá durante sete anos aprendendo todos os dias.
EMPRESÁRIO DIGITAL E como você começou a trabalhar de forma independente?
LUCAS ROSA Cresci muito individualmente, e começou a ter uma troca natural de bastão. O Meca já não queria trabalhar para alguns clientes mais desgastantes, que te consomem, mas são necessários para a vida útil de uma empresa, e começou a selecionar os projetos nos quais iria depositar sua energia. Então chegavam vários projetos em que ele não colocava mais a mão, e quem
gerenciava do começo ao fim era eu. Até que chegou um momento em que minha permanência ficou insustentável. Eu já tinha muito trabalho lá dentro, muito trabalho por fora, já tinha um nome estabelecido, mas eu não tinha uma empresa. Entrei num dilema gigantesco, de sair ou não sair, por ser eternamente agradecido por aquele lugar… Mas o Meca foi brilhante, disse para eu ir e levar todos os clientes com os quais ele não queria mais trabalhar. Foi muito gratificante. Então, quando abri meu próprio estúdio, oito anos atrás, já tinha uma cartela de clientes muito segura e estabelecida.
EMPRESÁRIO DIGITAL Como é seu processo criativo?
LUCAS ROSA Muito do meu processo criativo acaba sendo uma visita ao meu eu interno. A criatividade é individual e intransferível de artista para artista. E ela é um músculo que precisa estar em constante exercício. Não funciona como uma lâmpada que você liga só na hora que precisa. E deixá-la disponível sempre tem a ver com a forma como você respira, o que você traz para o seu cotidiano. Por isso é tão importante que nós, artistas, estejamos sempre atentos para nos inspirar. Quando você trabalha num projeto de publicidade, tem de descobrir não somente o que faz sentido para você, mas principalmente ter um sentimento de empatia, analisar o que o público quer e como ele vai sentir de acordo com o que você quer expressar. O processo criativo passa por isso: saber extrair da visão do cliente o que o eu interno dele quer, pensando não somente naquilo que você deseja passar, mas como as pessoas vão receber. Meu processo vai por aí: fazer a captação, extração, informação, fugir 100% do óbvio, não cair na linha do clichê e me referenciar em questões que podem me inspirar sem ter um viés muito desenhado. Quando recebo um projeto de embalagem
para uma joia, por exemplo, o último lugar em que vou buscar referências é nos concorrentes do segmento. Para não basear minha criação em algo que alguém já fez.
EMPRESÁRIO DIGITAL Como você divide na sua cabeça os trabalhos em que precisa ser mais restrito ao que o cliente pede e aqueles em que pode expressar mais sua arte?
LUCAS ROSA Essa divisão não existe na minha cabeça. Não consigo separar o artista do profissional mais pragmático. O projeto tem um timing e tem um budget. Quando esse budget atinge meu valor/hora, eu tenho de entregar. Ou estaria pagando para trabalhar. Eu tento o tempo inteiro ser o melhor artista para cada projeto e me adequar para ter a melhor entrega. Hoje em dia eu já posso escolher os projetos que vão me dar mais liberdade para expressar o que eu consigo fazer de melhor. Dá para ir além sempre. No mercado hoje, extremamente concorrido e dinâmico, se você não vai além, não entrega um pouco a mais, não coloca a sua assinatura, o trabalho é em vão. E um trabalho em vão mata o seu negócio. O trabalho entregue é importante para o seu cliente. A história do trabalho entregue é importante para o seu próximo cliente.
EMPRESÁRIO DIGITAL Essa liberdade te tranquiliza para rejeitar alguns projetos?
LUCAS ROSA Não tenho medo de falar não para um cliente. O seu não acaba valorizando o seu sim. Muitas vezes o cliente tem uma expectativa, mas não sabe como é a criação, e quer definir a sua entrega em cima de uma cultura de mercado que sempre foi tendenciosa no sentido de te espremer. E eu vou na contramão de tudo isso.
EMPRESÁRIO DIGITAL Você tem sido elogiado por artistas renomados. Tem a ambição de partir para uma área exclusivamente de arte, envolvendo exposições?
LUCAS ROSA A minha formação foi publicitária, caí nesse mercado para produzir para os clientes, sendo muitas vezes brifado. Mas sempre fui disruptivo. Sempre bati de frente quando não concordava com a visão de um projeto ou quando achava que podia melhorar por meio de decisões que não estavam pautadas inicialmente. Então sempre tive esse viés de colocar a minha linha autoral. E comecei a conhecer muitos artistas, porque eles passaram a me chamar para finalizar suas imagens, então comecei a ter essa sensação de que podia fazer isso para mim mesmo. E estou fazendo. Já produzi algumas imagens, tenho algumas séries prontas, estou prestes a dar esse próximo passo e já sabendo do meu potencial criativo.
EMPRESÁRIO DIGITAL O que significa arte para você?
LUCAS ROSA Um fator determinante e indispensável na vida de todas as pessoas. É ela que desperta sentimentos, voluntariamente ou involuntariamente, em alguém. A forma como cada pessoa desperta esse sentimento é o que torna uma arte única. Quando a gente se sente tocado por uma música, uma cena de um filme ou por uma imagem, eu não consigo mensurar como cada pessoa recebe aquilo. Para mim, a arte é criar uma linguagem visual que extrapola a questão de se é bonita ou feia. Ela passa uma mensagem que vai além da primeira percepção que você tem sobre o resultado. Numa publicidade de comida, por exemplo, meu maior desejo é gerar essa emoção e passar a linguagem visual para a pessoa sair com fome quando vir essa imagem. Aí tenho certeza de que expressei a mensagem que aquela arte deveria ter.
EMPRESÁRIO DIGITAL Qual é o papel da arte no digital?
LUCAS ROSA Principalmente com a Web 3.0 vindo aí fortemente, com a quantidade enorme de informações e conteúdo recebido, tudo hoje em dia é muito dinâmico. Ao mesmo tempo que isso é bom pelo acesso imediato às informações, isso também deixa as coisas mais descartáveis. O conteúdo tem um tempo de vida muito curto no digital. Muito do papel da arte é gerar um sentimento que passe por retenção. A gente sempre quer chamar atenção das pessoas, quer ser notado, isso faz bem ao nosso ego, e também porque a atenção está atrelada ao sucesso numa venda, seja um produto, uma arte, o que for. Acredito que agora o papel da arte não é mais chamar a atenção. É criar retenção. Ter esse sentimento de empatia e conexão com seu público. Importa mais se a pessoa realmente parou para te ouvir. Não é um simples ponto de captura. O meu trabalho é ligado a isso. Gerar um sentimento que dure o máximo possível, para a pessoa permanecer por mais tempo conectada ao projeto ou à série artística que eu desenvolvi. No digital, como tudo hoje é descartável, a arte tem esse papel de estender um pouco mais o tempo de vida daquilo que está sendo produzido.
EMPRESÁRIO DIGITAL Os filtros de aplicativos como o Instagram dão a impressão de que todo mundo é artista visual. Como o Photoshop permanece relevante nesse contexto?
LUCAS ROSA O Photoshop é um software potente, que é a extensão de quem eu sou. Tudo o que eu vou pedir para ele, parece que ele sabe o que há na minha mente. Mas o grande segredo da criação é que não importa se estou com papel e caneta, se estou usando um filtro de aplicativo, se estou com Photoshop, se estou riscando cimento com carvão. A imagem nasce na minha mente e é expressa com essas ferramentas. Já houve um preconceito, de que uma fotografia sem Photoshop seria uma imagem mais pura e valiosa, porque não foi manipulada. E a mesma coisa acontece com os filtros dos apps. “Ah, você distorceu uma realidade”. Mas o que é real? A partir de um momento em que pego uma câmera, coloco num tripé, acerto o foco, diafragma, velocidade, monto um cenário e ajusto as luzes, o real já não existe.
EMPRESÁRIO DIGITAL Que trabalhos para grandes empresas mais te marcaram?
LUCAS ROSA É difícil definir um. Ao longo desses meus 15 anos de mercado, tive a honra de trabalhar para muitas marcas bem interessantes: McDonald’s, Unilever, Sadia, Seara, Nestlé, Boticário, Tiffany&Co, Johnnie Walker, Vigor, Bauducco, Heineken, Philip Morris, Warner Bros, entre tantos outros… Clientes que me possibilitaram criar projetos que valorizaram o produto deles e me valorizaram como artista também. E cada empresa com uma visão criativa diferente, uma forma diferente de lidar com o projeto. Acho que é por isso que me apaixono tanto pelo que eu faço: porque não é uma rotina. Sempre me preocupei em melhorar minha técnica, melhorar meu portfólio para ter essa oportunidade de trabalhar com grandes marcas. Gente que entende que a criatividade não é fazer algo que ninguém nunca fez. É fazer algo que já existe de uma maneira completamente diferente.
EMPRESÁRIO DIGITAL Como foi para você, um artista, lidar com o mundo prático do empreendimento?
LUCAS ROSA Eu precisava transformar meu trabalho artístico num negócio seguro e palpável. Apesar de a arte ser algo intangível na cabeça das pessoas, ela precisa ser tangível para uma sustentabilidade financeira. E eu cresci tendo um rigor em transformar tudo aquilo que eu estava me tornando como artista em algo que tivesse valor como empresa. Se eu morrer amanhã, a empresa não morre junto comigo. Perde uma grande parte do valor dela, claro, mas construí uma estrutura de trabalho com outras pessoas que compartilham a responsabilidade pelos projetos. Isso eu aprendi no estúdio do Meca. Empreender foi exatamente isso, ser o mais artístico possível num projeto, mas cobrar bem, ter as coisas organizadas, aprender a gerir principalmente o tempo, que é a única coisa que a gente sabe que vai acabar uma hora na vida.
EMPRESÁRIO DIGITAL Como nasceu a iniciativa de compartilhar seu conhecimento com cursos?
LUCAS ROSA Com a quantidade de coisas que você vê hoje em dia no mundo digital, e com a rapidez das transformações, sempre tive claro que, para aprender algo, eu precisava anotar, deixar aquilo documentado, para não esquecer. E eu sempre documentei escrevendo, gravando vídeos, escrevendo um blog fechado só para mim. Então tudo o que eu via de novidade, fosse um link, uma página, uma imagem, um conteúdo, eu documentava de alguma forma. Foi quando percebi que, além de produzir conteúdo, eu devia compartilhar esse conteúdo. Aí comecei a ajustar não só a forma como eu produzia, mas a minha metodologia, para explicar o que eu produzia. No Brasil esse é um gap gigantesco. Existem muitos profissionais bons na área, mas que não sabem passar seu conhecimento adiante porque não têm método, não ajustaram sua forma de comunicação. Comecei a estudar como transmitir essas informações de uma forma didática, explicar o óbvio de forma simples, economizando tempo. Porque às vezes uma dica rápida pode mudar a trajetória profissional de alguém. E compartilhar muito conteúdo começou a me dar notoriedade. Uma imagem que eu produzia sempre tinha um making off, um bastidor, sempre contava a história do projeto, tinha fotos legais da
imagem, tinha o estúdio envolvido. Comecei a produzir esses conteúdos em 2010 e a ter audiência por causa disso, as pessoas passaram a me seguir no Facebook. Logo migrei para o Instagram, onde ganhei mais audiência, sempre com essa preocupação de criar novos profissionais.
EMPRESÁRIO DIGITAL Até que chegou uma hora em que você transformou esse compartilhamento em um produto…
LUCAS ROSA Exato. Por mais que eu ame fazer gratuitamente, essa educação gera uma necessidade de você melhorar a entrega. Então você precisa de um time que vai ajudar a produzir o conteúdo, editar da melhor forma, dar suporte, vender aquele conteúdo para você, fazer com que essa didática se torne realmente um produto profissional. Em 2017, eu gravei o Primeira Classe, meu produto digital que basicamente ensina tudo o que eu faço, desde a etapa zero até o cara se tornar um artista visual. A gente passa por todo o processo, de pegar o iniciante que não sabe nem instalar o software até ele ter condições de virar um artista digital. Tento ser para eles o que o Meca foi para mim. E a internet nos dá essa possibilidade de multiplicar isso para milhares de pessoas.
EMPRESÁRIO DIGITAL Hoje, com todo o reconhecimento que você tem, seus pais têm outro olhar?
LUCAS ROSA Eu usei durante muito tempo, como combustível, essa necessidade que criei dentro de mim de provar, principalmente para o meu pai, que eu ia dar certo. Meus primeiros anos foram realmente com sangue nos olhos para fazer as coisas acontecerem. Porque eu queria, em algum momento, ter a possibilidade de olhar para ele e dizer que ele estava errado. Mas, depois que tudo deu certo, eu vi que isso era desnecessário. E ele também viu que só repassou todo o protecionismo que ele aprendeu por tradição. Faltou um pouco de sensibilidade para ele entender que não era o que eu queria, mas talvez não houvesse como ele compreender porque nunca tinha vivido isso. Quando eu mostrei resultado, ele também baixou a guarda. A gente acabou resolvendo mais tarde de uma forma bem legal e amigável. E foi importante para mim, ter vivido isso. Talvez, se eu tivesse mais apoio dele e facilidade, tomasse outras decisões que não me trouxessem até aqui. A falta de segurança muitas vezes faz com que você arrisque. E o risco tem pontos muito positivos. É o empreender, né? Um frio na barriga constante.