Compartilhe com sua comunidades

O iFood no patamar das Big Techs Globais

Um olhar sobre a ambição, a cultura e a ousadia do CEO que está redefinindo o caminho da maior empresa de tecnologia de alimentos da América Latina para competir com gigantes de todo o planeta.

Desde que assumiu a presidência do iFood, em maio de 2024, Diego Barreto tem se consolidado como um dos líderes mais inquietos e visionários do país. Formado em economia, com passagens por grandes corporações e uma carreira marcada por movimentos de disrupção, ele também é autor de dois best-sellers sobre inovação e capitalismo empreendedor: Cientista e o Executivo: Como o iFood alavancou seus dados e usou a inteligência artificial para revolucionar seus processos, criar vantagem competitiva e se tornar um case mundial de sucesso, e Nova Economia: Entenda por que o perfil empreendedor está engolindo o empresário tradicional brasileiro. Os livros nasceram, segundo ele, da necessidade de organizar ideias antes de transformá-las em estratégia.

E, no que diz respeito às ideias, Barreto sempre pensa grande: sua ambição é construir a maior empresa de tecnologia da América Latina. Para ele, o iFood deixou há muito tempo de ser uma empresa de delivery e caminha para se tornar um ecossistema global de conveniência, movido por inteligência artificial profunda, modelos proprietários e ambição de Big Tech. Nesta entrevista exclusiva para a Empresário Digital, o executivo fala sobre cultura, inovação, competição, futuro do trabalho, expansão financeira e o papel do Brasil na fronteira tecnológica.

Ter escrito dois best-sellers te ajudou, de alguma forma, nessa trajetória até se tornar CEO do iFood?
Escrever é um hábito de muito tempo. É uma forma muito boa de conseguir organizar todos os pensamentos e entender coisas que se repetem, coisas que fazem sentido conectadas, coisas que não têm ligação. Ou seja, no final, é a capacidade de organizar o conhecimento que você vai construindo ao longo do tempo. Trazer isso para o papel ajuda a refletir mais e mais sobre o que ainda pode ser utilizado para frente e o que precisa ser revisado. Então, escrever os livros me deu muito dessa capacidade de organizar a parte da trajetória olhando para frente.

Você diz que quer que o iFood seja visto como uma Big Tech brasileira global, e não apenas uma empresa de delivery. O que muda na operação com essa lógica?
O que a gente busca aqui no iFood é um sonho grande. Sonhar pequeno ou sonhar grande vai dar o mesmo trabalho. No final, você está colocando o teu tempo, tua energia, teus recursos para realizar. A nossa cabeça aqui é de quem vai impactar o mundo como um todo a partir do Brasil.

O que é se tornar uma grande empresa, um grande ecossistema que vai além do delivery? É a capacidade de amarrar tudo o que acontece no dia a dia de uma pessoa. Seja ela um consumidor, um entregador fazendo sua renda, um restaurante, uma farmácia, um supermercado, um pet shop vendendo, conseguindo expandir e prosperar. A ligação dessa grandeza que a gente tem faz parte da nossa cultura. Ela está ligada à prosperidade, e ao fato de que a complexidade que a gente adiciona no dia a dia gera muito valor para todo o ecossistema. E o ecossistema fica mais forte.

O mercado já absorveu essa mudança?
O mercado brasileiro, cada vez mais, entende o iFood como um grande ecossistema de conveniência. Hoje, as verticais que mais crescem são farmácia e mercado, por eexemplo. Junto com isso, os entregadores estão levando parte da sua renda para momentos do dia que não estão 100% ligados à comida. A comida está ligada ao almoço e ao jantar. Mas farmácia, supermercado, pet shop e outras ocasiões estão ligadas a vários outros momentos. O entregador faz renda a partir disso. Ou seja, ele entende que é menos sobre delivery de comida e mais sobre delivery de conveniência como um todo.

Qual é o impacto mais imediato da inteligência artificial na operação do iFood?
IA, para nós, é uma realidade desde 2018, quando começamos a jornada. Hoje, já são quase 200 modelos proprietários usando machine learning e mais de 4.500 agents usando IA generativa. O impacto primordial tem a ver com crescimento. Quanto mais o meu serviço melhora e é eficiente, consigo transferir isso para o consumidor, mais o consumidor vem, fica e aumenta a frequência. Como consequência, cresce o restaurante e cresce a renda do entregador.

Por que criar um modelo generativo próprio, em vez de usar os modelos globais disponíveis?
A gente tomou a decisão de criar um modelo proprietário porque queria muito gerar inteligência a partir do treinamento com os dados que a gente captura do ecossistema. Quando eu faço isso dentro de casa, tenho outro nível de privacidade, confiança e ganho inteligência para construir a arquitetura de modelos dentro de um sistema generativo. Isso torna o modelo único. Saio de uma lógica de comoditização e vou para uma de geração de valor que é nossa.

Esse modelo já alterou a jornada, ticket médio ou experiência do usuário?
O modelo que a gente treina hoje, chamado LCM (Large Commerce Model), já está sendo usado em vários momentos da jornada. Por exemplo, hoje minha taxa de abertura de push é muito maior, porque o nível de customização por pessoa é enorme. A capacidade de aprender quem você é me permite direcionar páginas como farmácia de forma muito mais específica para o teu momento de vida. Eu saio de uma lógica linear e vou cada vez mais para uma lógica de personalização.

O que é o iFood Salão e como isso reposiciona a empresa?
É uma iniciativa de replicar no mundo offline o que fizemos no online. No digital, tivemos a capacidade de gerar tráfego, fazer o restaurante vender, fidelizar o consumidor que descobre a oportunidade e fica.

Agora replicamos isso no offline. Com o conhecimento que temos do consumidor, o dever é trazê-lo para o mundo presencial, entender oportunidades e preferências e mantê-lo dentro do ecossistema. Ganha o consumidor na conveniência e ganha o restaurante, aumentando a venda offline.

O restaurante não vê isso como concorrência?
Não, pelo contrário. O restaurante não tem ferramenta de captação offline. Você deve lembrar dos famosos cartões de dez carimbos. Por quê? Porque falta ferramenta digital de aquisição no offline.

Qual o objetivo de solicitar licença para operar como banco comercial em 2026?
O que o iFood pretende é ser uma fintech com serviços disponíveis. As pessoas confundem isso com ser um banco, mas é diferente. O objetivo é levar um serviço customizado a partir do entendimento de risco – do consumidor, do restaurante, do entregador.

Quando eu entendo isso bem, consigo precificar de forma mais correta e oferecer mais serviços. Restaurantes têm pouco acesso a crédito. Estamos chegando a uma carteira de mais de R$ 2 bilhões. Por quê? Porque consigo individualizar risco e crédito.

Quem é o público-alvo desse braço financeiro?
Para crédito, o grande público é o restaurante. Para comodidade, sem gerar receita, é o entregador. Para experiência de compra, é o consumidor.

Como o iFood compete com ecossistemas globais tão capitalizados?
Por dois motivos. Primeiro, porque tem uma cultura com lógica específica, que permite inovar na fronteira da tecnologia. Assim, consigo competir de igual para igual. Segundo, pelo acesso à capacidade financeira enorme da Prosus, nosso principal investidor.

O iFood diz ter resolvido a equação econômica do delivery antes de outros mercados. O que permitiu isso?
O que permitiu foi escala muito grande em uma concentração clara. O delivery adiciona custo, é fato. Mas ele ocupa o lado da cozinha ociosa. Quando adiciono custo, reduzo a ociosidade e ganho margem e escala, o resultado para o restaurante é bom. Isso fez os restaurantes virem primeiro e escalarem depois.

O frete grátis ainda é sustentável?
Depende da forma como o consumidor reage. A lógica do frete grátis está associada à aquisição de cliente. Quando o cliente prova e adora a comida, deveria ao longo do tempo passar a pagar o frete. Outra forma é entender um jogo de escala: para certos produtos ou momentos, sempre será grátis. Depende da ocasião e da decisão conjunta com os restaurantes.

O episódio de espionagem corporativa mudou a governança interna?
Eu não acho que aquilo revelou competição alta. Revelou baixo nível de ética. Competição alta eu vivo sempre. Meu problema é observar práticas de empresas que aliciam profissionais, pagando valores para conversas e revelação de informações privadas. Tivemos que reforçar fluxos internos, privacidade de documentos e ir à polícia. Já temos mandados de busca e apreensão. Nosso objetivo é chegar a mandados de prisão.

Automação dificulta ou fortalece a cultura organizacional?
O que favorece cultura é praticá-la. A direção da empresa não deveria atrapalhar a cultura, ela vive independentemente disso. Tudo que fazemos em IA leva para automações, mas isso é prova da nossa cultura. Não fazemos isso para cortar custo, mas para inovar, prestar serviço ao entregador, restaurante, farmácia, mercado, pet shop de forma inédita no mundo. As pessoas reconhecem o valor da inovação.

Que tipo de empresa o iFood será em 2030?
Um grande ecossistema, muito maior do que é hoje, com novas interfaces e tudo alavancado por inteligência artificial. A IA é mandatória para cada pessoa aqui dentro.

Como é ser um expoente nacional nesse mercado globalizado?
O ponto importante é contar toda essa história dizendo que somos brasileiros. As grandes empresas de tecnologia do mundo não são brasileiras. Não é aqui que, em regra, se sonha em fazer tecnologia de ponta. Mas estamos provando que somos capazes. Sempre digo: nós seremos a geração que vai acabar com o complexo de vira-lata. A geração que vai fazer a gente acreditar que é capaz.

Marco Marcelino

Informação valiosa, 
no tempo certo

Assine nossa newsletter

Anúncio

O dezembro começou com barulho. A The Led recebeu um aporte de R$ 150 milhões da Kinea e reposicionou o DOOH brasileiro como protagonista na disputa pela atenção. Um movimento...
No palco central do Web Summit 2025, Tim Berners-Lee e John Bruce defenderam a face mais urgente da nova internet… a soberania digital. Lauren Jackson conduziu uma conversa que mostrou...
A história da IQM no WebSummit Lisboa 2025 parece ficção científica, mas é só execução fria e ousadia técnica. Jan Goetz e Tom Henriksson revelaram como uma startup que começou...
A palestra de Philip Rathle, CTO da Neo4j, no WebSummit Lisboa 2025 virou um sinal de alerta no debate sobre IA. Ele mostrou que agentes inteligentes não falham por falta...
A palestra de Sara Vienna expõe o relacionamento invisível entre humanos e IA e mostra por que o futuro do design exige lucidez, responsabilidade e valor real....
Como criadores e marcas constroem comunidade, contexto e confiança antes do produto. Um case de storytelling, conteúdo e impacto real....